Questão 05
(FGV – OAB – VI Exame Unificado – 02/2012)
Trácio foi denunciado pela prática do delito descrito no artigo 333 do Código Penal. A peça inaugural foi recebida pelo Juiz Titular da Vara Única da Comarca X, que presidiu a Audiência de Instrução e Julgamento. Encerrada a instrução do feito, o processo foi concluso ao juiz substituto, que proferiu sentença condenatória, tendo em vista que o juiz titular havia sido promovido e estava, nesse momento, na 11ª Vara Criminal da Comarca da Capital. De acordo com a Lei Processual Penal, assinale a alternativa correta.
(A) A sentença é nula, porque foi prolatada por juiz que não presidiu a instrução do feito, em desacordo com o princípio da identidade física do juiz.
(B) A sentença é nula, porque ao juiz substituto é vedada a prolação de decisão definitiva ou terminativa.
(C) Não há nulidade na sentença, porque não se faz exigível a identidade física do juiz diante das peculiaridades narradas no enunciado.
(D) A sentença é nula, porque viola o princípio do juiz natural.
Gabarito: “C”
(Comentários – Jorge Farias)
Em continuidade ao nosso compromisso de auxiliar nossos leitores eventualmente candidatos a certames promovidos pela Fundação Getúlio Vargas, em especial o Exame da OAB, trazemos questão que bem reflete o nível de dificuldade que referida banca vem buscando imprimir às suas provas.
Trata-se de questão a exigir bons conhecimentos acerca de importante princípio informador do processo penal brasileiro, qual seja, o da identidade física do juiz, que se fundamenta na conveniência, tanto para a acusação quanto para a defesa, de que o juiz prolator da sentença seja o que teve contato direto com a produção da prova, e, assim, deteria um conhecimento mais preciso dos fatos, além das impressões pessoais do magistrado em face da presença do acusado e das vítimas, geralmente insuscetíveis de registro nos autos.
Com as reformas empreendidas no CPP por meio da Lei nº 11.719/2008, o princípio da identidade física do juiz restou positivado no art. 399, § 2º, assim redigido:
Art. 399. Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente.
§ 1o O acusado preso será requisitado para comparecer ao interrogatório, devendo o poder público providenciar sua apresentação.
§ 2o O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença.
Trata-se de princípio até então afeto ao ordenamento processual civil, e que, por isso, deve ser complementado à luz dos dispositivos do CPC, diploma de aplicação subsidiária ao CPP (art. 3º). Nesse contexto, confira-se o art. 132 do diploma adjetivo civil:
"Art. 132 - O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor.
Parágrafo único - Em qualquer hipótese, o juiz que proferir a sentença, se entender necessário, poderá mandar repetir as provas já produzidas.”
A esse respeito, convém trazer à colação recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, assim ementado:
“HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. ALEGAÇÃO DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PLEITO PELO RECONHECIMENTO DE NULIDADE. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 132 DO CPC. INOCORRÊNCIA. INTERROGATÓRIO. INVERSÃO NA ORDEM DE FORMULAÇÃO DAS PERGUNTAS. EXEGESE DO ART. 212 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.690/08. OFENSA AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CONSTRANGIMENTO EVIDENCIADO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.
1. O princípio da identidade física do juiz, introduzido no sistema processual penal pátrio pela Lei n.° 11.719/08, deve ser analisado, conforme a recente jurisprudência da Quinta Turma deste Superior Tribunal, à luz das regras específicas do art. 132, do Código de Processo Civil.
2. O fato de o juiz substituto ter sido designado para atuar na Vara do Tribunal do Júri, em razão de férias da Juíza titular, realizando o interrogatório do réu e proferindo a decisão de pronúncia, não apresenta qualquer vício apto a ensejar a nulidade do feito.
(…)” (HC 151.054/AP, Rel. Min. Adilson Vieira Macabu – Des. Conv. TJ/RJ, DJe de 03.02.2012)
Portanto, nota-se que a questão ora analisada exigiu do candidato amplo conhecimento do princípio da identidade física do juiz, na medida em que a resposta parece exsurgir não exatamente do CPP, mas do CPC, uma vez que o enunciado relata situação excepcional, não contemplada pelo diploma processual penal, qual seja, caso em que o juiz que presidiu a audiência de instrução e julgamento foi promovido, de modo que a sentença teve de ser prolatada por juiz substituto.
Nesses termos, conclui-se que se faz correta a alternativa “C”, que afirma não haver nulidade na sentença prolatada por juiz substituto do magistrado que presidiu a instrução do feito, já promovido a outro juízo.
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