Questão 04
(CESPE – DPE/MA – Defensor Público – 2011)
A respeito da sentença, assinale a opção correta.
(A) O juiz pode dar nova classificação jurídica ao fato definido na denúncia ao prolatar a sentença (emendatio libelli), desde que mediante o prévio aditamento da denúncia e abertura de prazo para a defesa se manifestar.
(B) O réu se defende dos fatos narrados na denúncia e não da classificação a eles atribuída pelo órgão acusador, podendo o julgador, no momento da sentença, corrigir a tipificação, atribuindo-lhe definição jurídica diversa, desde que não aplique pena mais grave que a contida na denúncia.
(C) É lícito ao juiz, no ato de recebimento da denúncia, conferir definição jurídica aos fatos narrados na peça acusatória diversa da atribuída pelo MP, podendo, ainda, fazê-lo no momento da prolação da sentença, ocasião em que poderá haver emendatio libelli ou mutatio libelli.
(D) Caso as circunstâncias dos delitos narradas na denúncia sejam idênticas às consideradas na sentença condenatória, alterada apenas a tipificação dos crimes, a hipótese é de impor as regras do instituto da mutatio libelli.
(E) Não fere o princípio da correlação a inclusão na sentença de agravante legal não descrita na denúncia, mas demonstrada durante a instrução do feito, mormente se suscitada em sede de alegações finais da acusação pública.
Gabarito: “E”
(Comentários – Jorge Farias)
Como visto, a questão trata de dois importantes institutos do direito processual penal, quais sejam, a mutatio libelli e a emendatio libelli, que também foram objeto das reformas empreendidas em 2008, no caso, pela Lei nº 11.719.
A emendatio libelli consiste em mera correção da inicial, pelo juiz, para o fim de adequar o fato narrado e efetivamente provado ao tipo penal previsto na lei. Não se faz necessária a adoção de qualquer providência, pelo magistrado, para a prolação de sentença com a capitulação que entende correta, pois, como amplamente sabido em matéria de processo penal, o réu se defende dos fatos a ele imputados. A emendatio pode ser adotada em qualquer grau de jurisdição, sempre atentando-se para os limites da reformatio in pejus. Trata-se de instituto positivado no art. 383 do CPP, assim redigido após a reforma processual:
“Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave.
§ 1o Se, em conseqüência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o disposto na lei.
§ 2o Tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão encaminhados os autos.”
Por seu turno, a mutatio libelli ocorre quando o fato provado não está contido, nem implicitamente, na inicial. Ou seja, a instrução probatória revela a existência de fato diverso, ensejador de aditamento da denúncia ou queixa, para permitir que em face dele se produzam o contraditório e a ampla defesa, para só então se chegar à sentença, nos termos do art. 384 do CPP, na redação dada pela Lei 11.719/2008:
“Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente.
§ 1o Não procedendo o órgão do Ministério Público ao aditamento, aplica-se o art. 28 deste Código.
§ 2o Ouvido o defensor do acusado no prazo de 5 (cinco) dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento.
§ 3o Aplicam-se as disposições dos §§ 1o e 2o do art. 383 ao caput deste artigo.
§ 4o Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento.
§ 5o Não recebido o aditamento, o processo prosseguirá.”
A mutatio libelli, diferentemente da emendatio, restringe-se ao primeiro grau de jurisdição, a teor do que dispõe a Súmula 453-STF: “Não se aplicam à segunda instância o Art. 384 e parágrafo único do Código de Processo Penal, que possibilitam dar nova definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa.”
Feitas essas importantes considerações iniciais, passa-se à análise das alternativas.
A – O juiz pode dar nova classificação jurídica ao fato definido na denúncia ao prolatar a sentença (emendatio libelli), desde que mediante o prévio aditamento da denúncia e abertura de prazo para a defesa se manifestar. INCORRETO.
Como se pode observar dos esclarecimentos iniciais, a alternativa busca confundir o candidato, na medida em que descreve hipótese de mutatio libelli, mas afirma tratar-se de emendatio.
B – O réu se defende dos fatos narrados na denúncia e não da classificação a eles atribuída pelo órgão acusador, podendo o julgador, no momento da sentença, corrigir a tipificação, atribuindo-lhe definição jurídica diversa, desde que não aplique pena mais grave que a contida na denúncia. INCORRETA.
A alternativa incorre em equívoco ao acrescentar vedação não prevista no CPP para a emendatio libelli, qual seja, a não aplicação de pena mais grave do que a contida na denúncia, pois o art. 383 permite tal expediente.
C – É lícito ao juiz, no ato de recebimento da denúncia, conferir definição jurídica aos fatos narrados na peça acusatória diversa da atribuída pelo MP, podendo, ainda, fazê-lo no momento da prolação da sentença, ocasião em que poderá haver emendatio libelli ou mutatio libelli. INCORRETA.
Como visto, seja a mutatio, seja a emendatio, somente são permitidas após a instrução do processo e não logo no ato de recebimento da denúncia, embora não se desconheça que respeitável parcela da doutrina sustente, ao menos, o cabimento da emendatio logo quando do recebimento da denúncia.
D – Caso as circunstâncias dos delitos narradas na denúncia sejam idênticas às consideradas na sentença condenatória, alterada apenas a tipificação dos crimes, a hipótese é de impor as regras do instituto da mutatio libelli. INCORRETO.
Mais uma hipótese de tentativa do examinador de confundir o candidato, desta feita trazendo caso de emendatio libelli, mas afirmando tratar-se de mutatio.
E - Não fere o princípio da correlação a inclusão na sentença de agravante legal não descrita na denúncia, mas demonstrada durante a instrução do feito, mormente se suscitada em sede de alegações finais da acusação pública. CORRETO.
Trata-se de exegese do art. 385 do CPP, assim redigido:
“Art. 385. Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada.”
E, mais uma vez, o CESPE exige do candidato o conhecimento da jurisprudência dos tribunais superiores, com outro exemplo de transcrição de excerto de julgado do STJ, qual seja, REsp 857.066/RJ (Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ de 14.04.2008), assim ementado:
“RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. DESCAMINHO E FALSIDADE IDEOLÓGICA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. REGIME DE PENA. PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. AGRAVANTE GENÉRICA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA Nº 211⁄STF. PENA-BASE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. CONCURSO MATERIAL DE CRIMES. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E IMPROVIDO. CONFISSÃO ESPONTÂNEA E REGIME DE PENA. HABEAS CORPUS DE OFÍCIO.
(...)
7. Não fere o princípio da correlação a inclusão na sentença de agravante legal não descrita na denúncia, mormente se suscitada em sede de alegações finais da Acusação Pública. Inteligência do artigo 385 do Código de Processo Penal.
8. "Nos crimes dolosos, o limite estabelecido no art. 44, inciso I, do CP é de ser observado, também, na hipótese de concurso de delitos" (REsp nº 435.074⁄TO, Relator Ministro Felix Fischer, in DJ 28⁄10⁄2003).
9. Recurso parcialmente conhecido e improvido. Habeas corpus de ofício.”
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