Questão 04
(CESPE – TRF2 – Juiz Federal Substituto – 2011)
Acerca dos juizados especiais criminais, assinale a opção correta.
(A) No caso de revogação obrigatória da suspensão condicional do processo pela circunstância de o beneficiário ser processado pela prática de outro crime no curso da suspensão, se for oferecida a denúncia e ocorrer a absolvição sumária do réu por decisão transitada em julgado, deverá haver repristinação do benefício revogado.
(B) Se, oferecida denúncia, deixar o MP de ofertar, por motivos desconhecidos, a proposta de suspensão condicional do processo, ainda que presentes todos os requisitos do benefício, e restando silentes o juiz, o acusado e seu defensor, admite-se a aplicação do benefício em qualquer tempo e grau de jurisdição, por ser direito público subjetivo do acusado.
(C) O descumprimento das condições estabelecidas na transação penal, homologada, ou não, pelo juízo, permite a propositura da ação penal e enseja a imputação do crime de desobediência, em concurso material, caso o magistrado deixe consignada, na proposta de transação, advertência a esse respeito, aceita pelo autor do fato e por seu advogado.
(D) A condenação anterior por crime culposo sem que se tenha aplicado pena privativa de liberdade não é circunstância impeditiva à suspensão condicional do processo.
(E) Tratando-se de crime contra a honra de servidor público federal, em razão do exercício de suas funções, admite-se, oferecida a queixa-crime, que a proposta de suspensão condicional do processo seja oferecida tanto pelo MP quanto pelo querelante, em razão da legitimidade concorrente para a ação penal.
Gabarito: “A”
(Comentários – Jorge Farias)
Trata-se de questão típica do CESPE, na medida em que exige essencialmente o conhecimento da jurisprudência mais recente dos tribunais superiores, o qual pode ser obtido pelos nossos leitores mediante o acompanhamento constante dos informativos jurisprudenciais do STF e do STJ.
Em matéria de processo penal, nota-se uma crescente exigência de temas referentes aos juizados especiais criminais, de modo que o candidato deve-se manter atento aos diversos aspectos processuais das Leis 9.099/95 e 10.259/2001.
Vejamos as alternativas.
A – No caso de revogação obrigatória da suspensão condicional do processo pela circunstância de o beneficiário ser processado pela prática de outro crime no curso da suspensão, se for oferecida a denúncia e ocorrer a absolvição sumária do réu por decisão transitada em julgado, deverá haver repristinação do benefício revogado. CORRETA.
A absolvição sumária é causa de restabelecimento do sursis quando revogado na hipótese do art. 89, § 3º, da Lei 9.099/95. A esse respeito, confira-se entendimento do STJ:
“HABEAS CORPUS. ESTELIONATO. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. BENEFÍCIO REVOGADO EM RAZÃO DA NOTÍCIA DE QUE OS PACIENTES RESPONDEM A OUTRA AÇÃO PENAL. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. RESTABELECIMENTO DO SURSIS.
1. Os pacientes foram denunciados por estelionato porque teriam simulado rescisão de contrato de trabalho, de forma a possibilitar o saque de quantia depositada em conta do FGTS.
2. Tão logo concedida a suspensão condicional do processo, sobreveio a notícia de que fora oferecida denúncia em outro feito criminal.
3. Ocorre que, naquela ação, proferiu-se sentença de absolvição sumária, com fundamento no art. 397, III, do Código de Processo Penal, notadamente porque atípicos os fatos e inepta a denúncia.
4. Nessa quadra, fulminada a referida ação penal, não há como se concluir estejam os pacientes sendo "processados por outro crime", nos moldes do § 3º do art. 89 da Lei nº 9.099/95.
5. Interpretação em sentido contrário, isto é, a de que o simples oferecimento da denúncia autoriza, de modo irreversível, a revogação do sursis processual, não anda em sintonia com os princípios da ampla defesa, do devido processo legal, e da boa-fé processual, destoando dos anseios da reforma do processo penal.
6. Habeas corpus concedido para cassar a decisão que revogou o sursis processual, com extensão dos efeitos aos corréus.” (HC 162.618/SP, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 02.08.2010)
B - Se, oferecida denúncia, deixar o MP de ofertar, por motivos desconhecidos, a proposta de suspensão condicional do processo, ainda que presentes todos os requisitos do benefício, e restando silentes o juiz, o acusado e seu defensor, admite-se a aplicação do benefício em qualquer tempo e grau de jurisdição, por ser direito público subjetivo do acusado. INCORRETO.
Primeiramente, sequer há consenso acerca do direito público subjetivo do acusado à suspensão condicional do processo, a exemplo do seguinte julgado:
“HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIMES CONTRA A HONRA. LEI DE IMPRENSA. CALÚNIA. DIFAMAÇÃO E INJÚRIA. AÇÃO PENAL PRIVADA. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. LEGITIMIDADE PARA O SEU OFERECIMENTO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 89, DA LEI N.º 9.099/1995. TITULAR DA AÇÃO PENAL. QUERELANTE. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. IMPOSSIBILIDADE DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. PLURALIDADE DE CRIMES. SOMATÓRIO DE PENAS. COMINAÇÃO IN ABSTRACTO SUPERIOR A UM ANO.
APLICAÇÃO DA SÚMULA N.º 243 DO STJ.
1. O benefício processual previsto no art. 89, da Lei n.º 9.099/1995, mediante a aplicação da analogia in bonam partem, prevista no art. 3.º, do Código de Processo Penal, é cabível também nos casos de crimes de ação penal privada. Precedentes do STJ.
2. A suspensão condicional do processo não é direito público subjetivo dos acusados, uma vez que a legitimidade para propô-la ou ofertá-la é faculdade atribuída unicamente ao órgão de acusação, no caso, ao querelante. Precedente do STF.
3. Não há, in casu, a possibilidade do oferecimento da suspensão porquanto a pena mínima cominada in abstracto, em razão do concurso de crimes, a torna superior a um ano. Aplicação do enunciado da Súmula n.º 243 do STJ.
4. Habeas corpus denegado.” (RHC 12.276/RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ de 07.04.2003)
Ademais, a suspensão condicional do processo depende de oferta pela acusação e aceitação pelo acusado e seu defensor, nos termos do art. 89 e seu § 1º.
Por fim, não cabe a concessão do sursis processual pelo juiz, de ofício:
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. OFERECIMENTO DE SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. PRERROGATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ART. 621, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DEMONSTRAÇÃO DE CLARA OFENSA AO CONJUNTO PROBATÓRIO. PRETENSÃO RECURSAL DE ABSOLVIÇÃO. VERBETE SUMULAR N.º 07 DESTA CORTE.
1. Na esteira da jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal, a proposta de suspensão condicional do processo é prerrogativa do Ministério Público, sendo vedado ao julgador oferecê-la de ofício.
2. A revisão criminal, com fulcro no art. 621, inciso I, do Código de Processo Penal, deve demonstrar que o decreto condenatório ofendeu de forma clara o conjunto probatório colhido durante à instrução, sendo diferente de um revolvimento de provas motivado
pela interposição de um recurso de apelação.
3. A pretensão recursal de absolvição esbarra no óbice do verbete sumular n.º 07 desta Corte.
4. Agravo regimental desprovido.”
C - O descumprimento das condições estabelecidas na transação penal, homologada, ou não, pelo juízo, permite a propositura da ação penal e enseja a imputação do crime de desobediência, em concurso material, caso o magistrado deixe consignada, na proposta de transação, advertência a esse respeito, aceita pelo autor do fato e por seu advogado. INCORRETO.
O descumprimento das condições estabelecidas por ocasião da transação penal não implica oferecimento de denúncia pela prática de crime de desobediência:
“PENAL E PROCESSUAL. CRIME DE MENOR POTENCIAL LESIVO. LEI 9.099/95. TRANSAÇÃO PENAL HOMOLOGADA. DESCUMPRIMENTO. DENÚNCIA. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE.
1. O descumprimento da transação penal, em razão dos efeitos da coisa julgada material e formal do acordo, não permite o oferecimento de denúncia por parte do ministério público e, muito menos, rende ensejo ao crime de desobediência.
2. Não sendo possível deflagrar persecutio penal em caso de descumprimento, resolve-se pela inscrição da pena (pecuniária) não paga em dívida ativa da União, nos termos do art. 85 da Lei nº 9.099/95 combinado com o art. 51 do Código Penal, com redação dada pela Lei nº 9.286/96.
3. Ordem concedida para, tornando sem efeito a condenação pelo crime de desobediência, trancar a ação penal.” (HC 97.642/ES, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 23.08.2010)
Atenção para a desatualização da jurisprudência supra, na parte em que afirma ser incabível oferecimento de denúncia ante o descumprimento de transação penal, na medida em que recentemente reconhecida pelo STF tal possibilidade, em sede de repercussão geral:
“HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO (ART. 10, CAPUT, DA LEI N. 9.437/97). PROPOSTA DE TRANSAÇÃO PENAL. HOMOLOGAÇÃO PELO JUÍZO. ARTIGO 76 DA LEI 9099/1995. POSTERIOR PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO PENAL ANTE O DESCUMPRIMENTO DAS CONDIÇÕES DO ACORDO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE OFENSA A PRECEITOS CONSTITUCIONAIS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA.
1. No âmbito desta Corte Superior de Justiça consolidou-se o entendimento no sentido de que a sentença homologatória da transação penal possui eficácia de coisa julgada formal e material, o que a torna definitiva, motivo pelo qual não seria possível a posterior instauração de ação penal quando descumprido o acordo homologado judicialmente.
2. Contudo, o Supremo Tribunal Federal, ao examinar o RE 602.072/RS, cuja repercussão geral foi reconhecida, entendeu de modo diverso, assentando a possibilidade de ajuizamento de ação penal quando descumpridas as condições estabelecidas em transação penal.
3. Embora a aludida decisão, ainda que de reconhecida repercussão geral, seja desprovida de qualquer caráter vinculante, é certo que se trata de posicionamento adotado pela unanimidade dos integrantes da Suprema Corte, órgão que detém a atribuição de guardar a Constituição Federal e, portanto, dizer em última instância quais situações são conformes ou não com as disposições colocadas na Carta Magna, motivo pelo qual o posicionamento até então adotado por este Superior Tribunal de Justiça deve ser revisto, para que passe a incorporar a interpretação constitucional dada ao caso pela Suprema Corte.
4. Ordem denegada.” (HC 188.959/DF, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 09.11.2011)
D - A condenação anterior por crime culposo sem que se tenha aplicado pena privativa de liberdade não é circunstância impeditiva à suspensão condicional do processo. INCORRETO.
A anterior condenação por outro crime á óbice à suspensão condicional do processo, ao menos segundo a literalidade do art. 89 da Lei 9.099/95:
Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).
E - Tratando-se de crime contra a honra de servidor público federal, em razão do exercício de suas funções, admite-se, oferecida a queixa-crime, que a proposta de suspensão condicional do processo seja oferecida tanto pelo MP quanto pelo querelante, em razão da legitimidade concorrente para a ação penal. INCORRETO.
Proposta a ação penal privada por crime contra a honra de servidor público no exercício de suas funções, a legitimidade para a propositura do sursis processual é do querelante:
“HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A HONRA. ALEGAÇÃO DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PLEITO PELO CABIMENTO DA SUSPENSÃO PROCESSUAL. IMPETRAÇÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. POSSIBILIDADE, EM CASO DE LEGITIMAÇÃO CONCORRENTE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 714/STF. AÇÃO PRIVADA. NESTES CRIMES, A LEGITIMIDADE PARA PROPOR O SURSIS PROCESSUAL É DO QUERELANTE. DENEGAÇÃO DA ORDEM.
1. É de entendimento uníssono dos Tribunais Superiores que o Ministério Público pode impetrar o remédio heroico (art. 654, caput, CPP), desde que seja para atender ao interesse do paciente.
2. Cabe a propositura da queixa-crime ao ofendido que optou em promover a ação penal privada, não se podendo aceitar que o Ministério Público ingresse no pólo ativo da demanda, exceto no caso de representação ou flagrante negligência do titular no seu curso. A referida orientação está cristalizada na edição da Súmula n.º 714/STF: "É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções."
3. O Superior Tribunal de Justiça, em remansosos julgados considera crível o sursis processual (art. 89 da Lei nº 9.099/95) nas ações penais privadas, cabendo sua propositura ao titular da queixa-crime.
4. A legitimidade para eventual proposta de sursis processual é faculdade do querelante. Ele decidirá acerca da aplicação do benefício da suspensão condicional do processo nas ações penais de iniciativa, exclusivamente, privada.
5. Ordem denegada.” (HC 187.090/MG, Rel. Min. Adilson Macabu, DJe de 21.03.2011)
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