sexta-feira, 30 de março de 2012

Simulado 10/2012 - Direito Administrativo - Questão 2 - Comentários

2) (Cespe – CAIXA – Advogado - 2010) Com relação às teorias acerca da responsabilidade civil do Estado, assinale a opção correta.

A) No caso de danos causados por rebelião em presídio, que resulte na morte de detento, o STJ possui entendimento pacificado de que a responsabilidade do Estado somente ocorrerá na hipótese de restar demonstrada a culpa (ou dolo) do agente público responsável pela guarda.

B) A teoria do risco integral somente é prevista pelo ordenamento constitucional brasileiro na hipótese de dano nuclear, caso em que o poder público será obrigado a ressarcir os danos causados, ainda que o culpado seja o próprio particular.

C) Segundo a jurisprudência atual do STF, o art. 37, § 6.º, da Constituição Federal de 1988 (CF) deve ser interpretado no sentido de definir que a responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva somente em relação aos usuários do serviço, não se estendendo tal entendimento para os não usuários.

D) Segundo a jurisprudência majoritária do STJ, nas ações de indenização fundadas na responsabilidade civil objetiva do Estado, é obrigatória a denunciação à lide do agente supostamente responsável pelo ato lesivo, até mesmo para que o poder público possa exercer o direito de regresso.

E) Na hipótese de falha do serviço público prestado pelo Estado, é desnecessária a comprovação do nexo de causalidade entre a ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro.

Gabarito: B

COMENTÁRIOS (Rafael de Jesus)


(A) INCORRETA. A alternativa remete à jurisprudência do STJ sobre a responsabilidade civil do Estado em caso de morte de detento decorrente de rebelião em presídio. Em tais casos, não obstante não se costume aplicar a teoria do risco administrativo – que implica na responsabilização objetiva do Estado -, incide a teoria da falta do serviço, segundo a qual basta a comprovação do mau funcionamento do serviço, sendo desnecessário apontar especificamente qual seria o agente culpado. Confira o teor do seguinte acórdão do STJ:

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO POR MORTE DE PRESO EM CADEIA PÚBLICA.DEVER DE VIGILÂNCIA DO ESTADO (ART. 5º, XLIX, CF/88).

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. CULPA E NEXO DE CAUSALIDADE COMPROVADOS. SÚMULA 07/STJ.

1. A obrigação de indenizar imputada à entidade estatal por força do art. 5º, XLIX que assegura ao preso a integridade física é fundamento constitucional que afasta a competência do E. STJ.

2. É que, assentando o Tribunal a quo, verbis: [...]

Isto porque, na forma da Magna Carta Federal (art. 5º XLIX), é direito fundamental dos presos a integridade física e moral no cumprimento da pena. (fls. 153) (...) In casu, diante do conjunto probatório coligido nos autos, restou sobejamente evidenciado o ato ilícito da Administração Pública transpassado na negligência com que agiu diante do evento rebelião, já que, caso tivessem sido adotadas as mínimas cautelas exigidas do dever de ofício, a rebelião e consequentemente a chacina não teria ocorrido. (fls. 156)

[...]

5. A doutrina do tema não discrepa da solução jurisprudencial, senão vejamos: "A mesma regra se aplica quando se trata de ato de terceiros, como é o caso de danos causados por multidão ou por delinquentes; o Estado responderá se ficar caracterizada a sua omissão, a sua inércia, a falha na prestação do serviço público. Nesta hipótese, como na anterior, é desnecessário apelar para a teoria do risco integral; a culpa do serviço público demonstrada pelo seu mau funcionamento, não-funcionamento ou funcionamento tardio é suficiente para justificar a responsabilidade do Estado." (Maria Sylvia Zanella di Pietro, in Direito Administrativo, 18ª Edição, Editora Atlas, página 569).

[...]”

(REsp 1095309/AM, Rel. Ministro LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe de 01/06/2009)

Mas há de se ressaltar a existência de precedentes do STJ que afirmam ser objetiva a responsabilidade do Estado em casos tais, dispensando a prova de culpa em relação ao fato danoso, o que torna ainda mais incorreta a alternativa em comento:

“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DETENTO MORTO APÓS SER RECOLHIDO AO ESTABELECIMENTO PRISIONAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. SOBREVIDA PROVÁVEL (65 ANOS). PRECEDENTES.

[...]

2. No que se refere à morte de preso sob custódia do Estado, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a responsabilidade civil do ente público é objetiva.

[...]”

(REsp 847.687/GO, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Primeira Turma, DJ de 25/06/2007, p. 221)

(B) CORRETA. O art. 21, XXIII, d, da CF[1] traz uma norma especial para o dano nuclear. A doutrina direciona-se pelo entendimento de que esse dispositivo versa sobre a responsabilidade objetiva do Estado com fundamento na teoria do risco integral, em função dos graves riscos decorrentes da exploração da atividade nuclear. Até porque, se essa responsabilidade objetiva estivesse fundada no risco administrativo e não no risco integral, seria desnecessária a norma especial, porquanto já estaria abarcada pelo § 6º do art. 37 da CF. Logo, não há possibilidade de incidência de causas excludentes da responsabilidade civil, ou seja, o Estado responderá mediante a simples verificação da conduta, do nexo causal e do dano, não se isentando pela ocorrência de culpa exclusiva da vítima, culpa de terceiros ou de força maior.

(C) INCORRETA. A jurisprudência atual do STF concede sim caráter objetivo à responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público tanto em relação aos usuários do serviço quanto aos não usuários, a saber:

“CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE DO ESTADO. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO. PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO PRESTADORAS DE SERVIÇO PÚBLICO. CONCESSIONÁRIO OU PERMISSIONÁRIO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA EM RELAÇÃO A TERCEIROS NÃO-USUÁRIOS DO SERVIÇO. RECURSO DESPROVIDO.

I - A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não-usuários do serviço, segundo decorre do art. 37, § 6º, da Constituição Federal.

II - A inequívoca presença do nexo de causalidade entre o ato administrativo e o dano causado ao terceiro não-usuário do serviço público, é condição suficiente para estabelecer a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito privado.

III - Recurso extraordinário desprovido.”

(RE 591874, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 26/08/2009, Repercussão Geral – Dje 237 de 17/12/2009)

(D) INCORRETA. O STJ não admite a denunciação da lide (art. 70, III, CPC) em ações que buscam responsabilizar objetivamente o Estado por danos causados a outrem, porquanto assim seria preciso discutir elemento desnecessário para a responsabilização do Estado, qual seja, a culpa ou dolo do agente, o que atravancaria o andamento do feito:

"PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. IMPOSSIBILIDADE.

1. ‘A denunciação da lide, como modalidade de intervenção de terceiros, busca aos princípios da economia e da presteza na entrega da prestação jurisdicional, não devendo ser prestigiada quando susceptível de pôr em risco tais princípios' (REsp 43367/SP, 4ª Turma, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 24.06.1996).

2. No caso, conforme assentado pelas instâncias ordinárias, a denunciação da lide ao agente público causador do dano implicaria prejuízo à celeridade e à economia processual, o que impede sua admissão. 3. Recurso especial a que se nega provimento.

(REsp 770.590/BA, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Primeira Turma, julgado em 14/03/2006, DJ 03/04/2006, p. 267)".

Pontue-se ainda que o referido entendimento foi consagrado no enunciado nº 50 da súmula do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro: "Em ação de indenização ajuizada em face de pessoa jurídica de Direito Público, não se admite a denunciação da lide ao seu agente ou a terceiro (art. 37, § 6º, CF 88)" (DORJ-III, S-I 166 (4) - 03/09/2003).

(E) INCORRETA. A conduta, o dano e o nexo causal são elementos básicos da responsabilidade civil, ainda que se trate de responsabilização objetiva.



[1] “Art. 21. [...]

XXIII

[...]

d) a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa;”

Nenhum comentário:

Postar um comentário