Questão 03
(FCC – MP/CE – Promotor de Justiça – 2011)
O art. 366 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei no 9.271, de 17 de abril de 1996, dispõe sobre a suspensão do processo penal. Sobre esse instituto e sua aplicação é correto afirmar que
(A) a suspensão do processo é regra geral em caso de revelia no processo penal.
(B) haverá apenas suspensão dos prazos e do curso do processo, podendo o juiz determinar a produção de provas urgentes antecipadamente.
(C) a prisão preventiva apenas poderá ser decretada diante da impossibilidade de aplicação das medidas cautelares alternativas à prisão.
(D) a suspensão do prazo prescricional interrompe-se pela prática de novo delito pelo acusado.
(E) a decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo.
Gabarito: “E”
(Comentários – Jorge Farias)
A questão exige do candidato o conhecimento de dispositivo do CPP frequentemente cobrado em concursos, qual seja, o art. 366, assim redigido:
“Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.”
A - a suspensão do processo é regra geral em caso de revelia no processo penal. INCORRETO.
Da mera leitura do dispositivo acima transcrito já se observa que a suspensão do processo restringe-se ao caso de não atendimento a citação editalícia, com ausência do réu e não constituição de defensor.
A esse respeito, confira-se a lição de TÁVORA e ARAÚJO:
“Na atual sistemática, uma vez citado por edital, caso o réu não compareça nem constitua defensor, o processo deverá ser suspenso. Devemos destacar que não é apenas o fato de ter sido citado por edital que enseja a suspensão do processo. Aliada à citação editalícia, deve se afigurar a ausência do réu e a inexistência de defensor constituído.
(…)
Devemos reiterar que estas consequências (suspensão do processo e da prescrição) só se aplicam à citação editalícia. Como visto, se o acusado for citado pessoalmente, ou com hora certa, e não comparecer ou nomear defensor, ser-lhe-á nomeado um defensor público ou dativo (art. 263 do CPP) e o processo seguirá normalmente em todos os seus termos.”[1]
Ademais, essas conclusões podem ser extraídas da própria sistemática do CPP, que assim dispõe em seu art. 367:
“Art. 367. O processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo.”
B – haverá apenas suspensão dos prazos e do curso do processo, podendo o juiz determinar a produção de provas urgentes antecipadamente. INCORRETO.
Suspendem-se o processo e o curso do prazo prescricional. A assertiva peca por aludir genericamente a prazos, sem especificar tratar-se da prescrição.
Ou seja, viola a literalidade do art. 366 do CPP, até mesmo porque o termo “apenas” restringe as medidas cabíveis somente àquelas mencionadas na questão, quando o referido dispositivo legal também autoriza a decretação da prisão preventiva, não referida pela assertiva.
C – a prisão preventiva apenas poderá ser decretada diante da impossibilidade de aplicação das medidas cautelares alternativas à prisão. INCORRETO.
Por elucidativa, transcreve-se a lição de TÁVORA e ARAÚJO:
“Devemos repudiar a tese de que o juiz pode decretar a prisão preventiva de todos os acusados que, citados por edital, não comparecerem. Sobre a questão, estamos com Tourinho Filho, que afirma: “manifesta a absurdez dessa corrente. Muitas vezes o autor da conduta punível muda de endereço por uma série de motivos (despejo, procura de outro lugar onde encontre melhor colocação, p. ex.), menos para deixar de receber a citação. Não é justo, pois, que nesses casos seja-lhe decretada a medida extrema, violenta por natureza. Mas se houver prova de que realmente fugiu com receio de uma condenação, a medida odiosa até se justifica, por encontrar amparo no art. 312 do CPP.”a prisão preventiva apenas poderá ser decretada diante da impossibilidade de aplicação das medidas cautelares alternativas à prisão”[2]
Ademais, convém salientar que embora vigore o princípio da subsidiariedade da prisão preventiva na atual sistemática do CPP, o Código ainda autoriza a preventiva na situação narrada, diante da interpretação conjunta dos arts. 311 e seguintes:
“Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o).
Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:
I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;
II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal;
III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.”
D - a suspensão do prazo prescricional interrompe-se pela prática de novo delito pelo acusado. INCORRETO.
O prazo prescricional cuja suspensão ocorre por força do art. 366 do CPP refere-se à prescrição da pretensão punitiva, cujo rol de causas interruptivas não contempla a prática de novo delito, consoante se observa do art. 117 do CP, a seguir transcrito:
"Art. 117 - O curso da prescrição interrompe-se:
I - pelo recebimento da denúncia ou da queixa;
II - pela pronúncia;
III - pela decisão confirmatória da pronúncia;
IV - pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis;
V - pelo início ou continuação do cumprimento da pena;
VI - pela reincidência.
§ 1º - Excetuados os casos dos incisos V e VI deste artigo, a interrupção da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do crime. Nos crimes conexos, que sejam objeto do mesmo processo, estende-se aos demais a interrupção relativa a qualquer deles.
§ 2º - Interrompida a prescrição, salvo a hipótese do inciso V deste artigo, todo o prazo começa a correr, novamente, do dia da interrupção.
E – a decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo. CORRETO.
Trata-se de entendimento jurisprudencial pacificado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, de que é exemplificativo o aresto assim ementado (RHC 21.173/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 07.12.2009):
“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS . CITAÇÃO POR EDITAL. ART. 366 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRODUÇÃO ANTECIPADA DAS PROVAS. NECESSIDADE DE CONCRETA MOTIVAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL.
1. A jurisprudência desta Corte é pacifica no sentido de que a produção antecipada das provas, a que faz alusão o art. 366 do Código de Processo Penal, exige concreta demonstração da urgência e necessidade da medida, não sendo motivo hábil a justificá-la o decurso do tempo, tampouco a presunção de possível perecimento.
2. Recurso provido para anular a decisão que determinou a produção antecipada das provas, bem como todos os atos subsequentes, sem prejuízo de nova determinação fundamentada em dados concretos.”
Tal entendimento culminou com a edição da Súmula 455-STJ, assim redigida: “A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo.”
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