Prezados,
Seguem as questões de Processo Penal dessa semana, já conjugadas com os respectivos gabaritos comentados.
Fraternal abraço e bons estudos!
Questão 01
(CESPE – DPE/MA – Defensor Público – 2011)
Em relação às prisões e à liberdade provisória, assinale a opção correta.
(A) De acordo com o posicionamento pacífico da jurisprudência do STJ, o caráter hediondo da infração penal impede, por si só, a concessão da liberdade provisória.
(B) Por se tratar de institutos com requisitos distintos, não é vedada a concessão de liberdade provisória mediante fiança, ainda que presentes os pressupostos da prisão preventiva.
(C) A prisão cautelar é medida de caráter excepcional, devendo ser imposta apenas quando atendidas, mediante decisão judicial fundamentada, as exigências do art. 312 do CPP, cujos requisitos, no entanto, serão dispensados na hipótese de mera manutenção da prisão já decretada.
(D) Presentes os requisitos elencados no art. 312 do CPP, pode o juízo singular, ao proferir sentença condenatória, deixar de reconhecer ao condenado o direito de apelar em liberdade, exceto na hipótese de este ter permanecido em liberdade durante toda a instrução criminal.
(E) A periculosidade do agente, evidenciada pelo modus operandi da prática, em tese, criminosa, pode configurar legitimamente fator concreto que obsta a revogação da segregação cautelar para a garantia da ordem pública.
Gabarito: “E”
(Comentários – Jorge Farias)
Trata-se de questão com elevado nível de complexidade, pois além de exigir que o candidato mantenha-se atualizado acerca das alterações legislativas (novamente, se está a cobrar a Lei 12.403/2011), também demanda o conhecimento da jurisprudência sobre temas polêmicos, como a configuração dos requisitos da prisão cautelar no caso concreto, bem como da possibilidade de liberdade provisória em caso de crime hediondo.
A par das considerações abaixo expendidas, remetemos nosso leitor aos simulados anteriores, quando já procedemos a diversos esclarecimentos sobre os institutos da prisão cautelar, da liberdade provisória e das medidas cautelares diversas da prisão, sempre à luz do novo regramento legal.
A – De acordo com o posicionamento pacífico da jurisprudência do STJ, o caráter hediondo da infração penal impede, por si só, a concessão da liberdade provisória. INCORRETA.
Trata-se de tema talvez dos mais simbólicos acerca da flagrante divergência jurisprudencial entre as turmas criminais do STJ.
Ou seja, por estar longe de ser pacífico tal posicionamento, a assertiva já se revela, de plano equivocada.
Vejamos alguns arestos exemplificativos da referida controvérsia:
“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PRISÃO EM FLAGRANTE. TRÁFICO DE DROGAS. LIBERDADE PROVISÓRIA NEGADA. ALEGAÇÃO DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL NA SEGREGAÇÃO CAUTELAR. EXCESSO DE PRAZO. POSTERIOR PROLAÇÃO DE SENTENÇA. AUSÊNCIA SUPERVENIENTE DE INTERESSE PROCESSUAL. VALIDADE DA VEDAÇÃO CONTIDA NO ART. 44 DA LEI N.º 11.343/2006. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO.
1. Recorrente preso em flagrante em 07/07/2010, na posse de 550 gramas de crack, 26 gramas de cocaína, 25 gramas de haxixe e 1 barra de maconha, pesando aproximadamente 1,3 quilograma.
2. Quanto à alegação de excesso de prazo, constata-se, do andamento processual disponibilizado na página de internet do Tribunal de origem, a superveniência de sentença nos autos n.º 0049018-79.2010.8.13.0461, motivo pelo qual evidencia-se a perda do interesse processual no julgamento do presente recurso.
3. A teor da orientação firmada pela Quinta Turma deste Superior Tribunal de Justiça, a vedação expressa do benefício da liberdade provisória (e do apelo em liberdade) aos crimes de tráfico ilícito de entorpecentes é, por si só, motivo suficiente para impedir a concessão da benesse ao réu preso em flagrante por crime hediondo ou equiparado, nos termos do disposto no art. 5.º, inciso XLIII, da Constituição Federal, que impõe a inafiançabilidade das referidas infrações penais. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal.
4. Recurso parcialmente prejudicado e, no resto, desprovido.”
(RHC 30.999/MG, Rel. Min. Laurita Vaz, Dje de 02.02.2012)
“HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. LIBERDADE PROVISÓRIA. CABIMENTO. FUNDAMENTAÇÃO GENÉRICA.
1. A vedação da liberdade provisória não pode estar fundamentada apenas na gravidade abstrata do crime, nem em meras conjecturas e nas suas consequências sociais. Precedentes.
2. A Sexta Turma desta Corte, tem firmado o entendimento segundo o qual, ainda que se trate de delito de tráfico, a Lei n. 11.464/2007, ao suprimir do art. 2º, II, da Lei n. 8.072/1990 a vedação à liberdade provisória nos crimes hediondos, adequou a lei infraconstitucional ao texto da Constituição Federal de 1988, sendo inadmissível a manutenção do acusado no cárcere quando não demonstrados os requisitos autorizadores de sua prisão preventiva.
3. Ordem concedida.”
(HC 210.348/AC, Rel. Min. Vasco Della Giustina – Des. Conv. TJ/RS, Dje de 05.12.2011)
B – Por se tratar de institutos com requisitos distintos, não é vedada a concessão de liberdade provisória mediante fiança, ainda que presentes os pressupostos da prisão preventiva. INCORRETA.
A assertiva apresenta contradição lógica com dois importantes dispositivos do CPP a respeito do tema. Vejamos:
“Art. 321. Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código.”
“Art. 324. Não será, igualmente, concedida fiança:
I - aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 deste Código;
II - em caso de prisão civil ou militar;
III - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).
IV - quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312).”
C – A prisão cautelar é medida de caráter excepcional, devendo ser imposta apenas quando atendidas, mediante decisão judicial fundamentada, as exigências do art. 312 do CPP, cujos requisitos, no entanto, serão dispensados na hipótese de mera manutenção da prisão já decretada. INCORRETA.
Os requisitos ensejadores da prisão preventiva devem ser demonstrados sempre que a segregação cautelar for decretada, ainda que a título de manutenção da constrição da liberdade, consoante se depreende da sistemática decorrente do art. 315 do CPP (“A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada”), mas sobretudo do próprio imperativo constitucional de fundamentação das decisões judiciais (art. 93, IX), acerca do que TÁVORA e ARAÚJO lecionam o seguinte:
“A necessidade de fundamentação de toda e qualquer decisão judicial é decorrência direta do art. 93, IX, da Constituição Federal, ao asseverar: 'todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (…)'. A fundamentação, entretanto, exige mais do que a mera repetição do texto legal. Nada impede que a motivação seja concisa, desde que bem articulada. Todavia, é essencial que sejam externadas quais as razões que justifiquem a medida, e permitam o enquadramento em uma das hipóteses de decretação da preventiva, sob pena de patente ilegalidade, dando ensejo ao relaxamento prisional.”[1]
D – Presentes os requisitos elencados no art. 312 do CPP, pode o juízo singular, ao proferir sentença condenatória, deixar de reconhecer ao condenado o direito de apelar em liberdade, exceto na hipótese de este ter permanecido em liberdade durante toda a instrução criminal. INCORRETO.
O fato de o acusado ter permanecido em liberdade durante toda a instrução criminal não é óbice à decretação da prisão preventiva, a ponto de vedar o recurso em liberdade, uma vez que a segregação cautelar é medida que segue a cláusula rebus sic stantibus (“Art. 316. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem”).
Desse modo, pode-se fazer necessária em razão de elementos concretos somente revelados por ocasião da instrução e que se amoldem às hipóteses do art. 312 do CPP, a seguir transcrito:
“Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o).”
E – A periculosidade do agente, evidenciada pelo modus operandi da prática, em tese, criminosa, pode configurar legitimamente fator concreto que obsta a revogação da segregação cautelar para a garantia da ordem pública. CORRETO.
Trata-se de tema já pacificado na jurisprudência do STJ e do STF, de que são exemplificativos os seguintes julgados:
“PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. PRISÃO PREVENTIVA. RÉU FORAGIDO. NECESSIDADE DE RESGUARDAR A APLICAÇÃO DA LEI PENAL. MODUS OPERANDI. GRAVIDADE CONCRETA DAS CONDUTAS. PERICULOSIDADE DO AGENTE. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA.
I. O fato de o paciente estar foragido da justiça revela a sua intenção de frustrar a aplicação da lei penal, o que já é motivo suficiente para impedir a revogação de sua custódia preventiva, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal. (Precedentes).
II. Circunstâncias pessoais favoráveis ao réu que não permitem, isoladamente, a revogação da medida constritiva de liberdade, considerando a presença dos requisitos autorizadores da medida extrema.
III. Hipótese na qual o modus operandi pelo qual foi cometido o delito denota a necessidade da segregação provisória também para o fim de resguardar a ordem pública, pois o acusado teria praticado o crime com o emprego de brutalidade que excede à própria ao tipo penal a ele atribuído, demonstrando grande periculosidade. (Precedentes).
IV. Ordem denegada, nos termos do voto do Relator.”
(STJ, HC 168.577/PR, Rel. Min. Gilson Dipp, Dje 14.02.2012)
[1] TÁVORA, Nestor. ARAÚJO, Fábio Roque. CPP para Concursos. Salvador: Editora JusPodivm, 2010. p. 408.
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