domingo, 4 de março de 2012

Simulado 6_2012 - Processo Penal - Questão 2 - Comentários

Questão 02

(CESPE – DPE/MA – Defensor Público – 2011)

Assinale a opção correta, com referência à prova no âmbito do direito processual penal.

(A) Para a comprovação da prática de crimes contra a dignidade sexual, a palavra da vítima, ainda que corroborada por provas testemunhais idôneas e harmônicas, não autoriza a condenação, uma vez que o exame pericial é imprescindível nesses casos.

(B) Conforme entendimento do STJ, ante a evidente violação ao princípio da imparcialidade, o depoimento de policiais responsáveis pela prisão em flagrante do acusado não constitui meio de prova idôneo a embasar o édito condenatório, mesmo que corroborado em juízo.

(C) No processo penal, a prova emprestada tem sido admitida pela jurisprudência, desde que, no processo de origem dos elementos apresentados, tenha havido participação da defesa técnica do réu e desde que não seja o único dado a embasar a motivação da decisão.

(D) Vítima do delito de lesão corporal incapacitada para as ocupações habituais por mais de trinta dias deve submeter-se a exame pericial logo que decorra esse prazo, contado da data do crime, dado o caráter peremptório do prazo.

(E) Caso a confissão do réu, no bojo do inquérito policial, seja utilizada como prova para a condenação na ação penal, é obrigatória a sua consideração como circunstância atenuante na segunda fase de aplicação da pena, exceto se houver retratação em juízo.

Gabarito: “C”

(Comentários – Jorge Farias)

A – Para a comprovação da prática de crimes contra a dignidade sexual, a palavra da vítima, ainda que corroborada por provas testemunhais idôneas e harmônicas, não autoriza a condenação, uma vez que o exame pericial é imprescindível nesses casos. INCORRETO.

Trata-se de afronta ao entendimento consolidado dos tribunais superiores, os quais dispensam a exigibilidade de perícia – exame de corpo de delito – para os crimes sexuais, dada a possibilidade de desaparecimento de vestígios, sobretudo quando a maioria dos casos de tais delitos são descobertos tardiamente, contexto em que a palavra da vítima assume grande importância, a exemplo do seguinte julgado:

“HABEAS CORPUS. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. EXAME DE CORPO DE DELITO. ART. 158 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DESNECESSIDADE QUANDO PRESENTES PROVAS OUTRAS NOS AUTOS. DEPOIMENTO DA VÍTIMA. PRECEDENTES DO STJ E STF. ALEGADA NULIDADE INEXISTENTE.

1. Se mostra prescindível a perícia - exame de corpo de delito - para os crimes de estupro ou atentado violento ao pudor que, por vezes, não deixam vestígios, máxime havendo nos autos provas outras que auxiliem o julgador na formação do seu convencimento. Precedentes do STJ e STF.

2. Nos crimes contra os costumes a palavra da vítima assume preponderante importância, se coerente e em consonância com as demais provas coligidas nos autos, como é o caso da hipótese vertente, em que a ofendida expôs os fatos com riqueza de detalhes, tudo em conformidade com os demais depoimentos prestados pelas testemunhas em juízo.

3. "A palavra da vítima, em sede de crime de estupro ou atentado violento ao pudor, em regra, é elemento de convicção de alta importância, levando-se em conta que estes crimes, geralmente, não há testemunhas ou deixam vestígios" (HC 135.972/SP).”

(HC 177.980/BA, Rel. Min. Jorge Mussi, Dje de 01.08.2011)

B – Conforme entendimento do STJ, ante a evidente violação ao princípio da imparcialidade, o depoimento de policiais responsáveis pela prisão em flagrante do acusado não constitui meio de prova idôneo a embasar o édito condenatório, mesmo que corroborado em juízo. INCORRETO.

Embora se trate de argumento de defesa ainda bastante utilizado em juízo, o certo é que a jurisprudência dos tribunais superiores pacificou-se no sentido da admissibilidade, em regra, dos depoimentos dos policiais responsáveis pela prisão em flagrante do acusado como meio de prova idôneo para subsidiar eventual condenação.

A esse respeito, confira-se o seguinte julgado, exemplificativo do entendimento supra:

“DESCONSTITUIÇÃO DO ÉDITO REPRESSIVO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO APROFUNDADO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ESTREITA DO WRIT. CONDENAÇÃO FUNDAMENTADA NO DEPOIMENTO DE POLICIAIS MILITARES. MEIO DE PROVA IDÔNEO. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO NÃO DEMONSTRADA. ORDEM DENEGADA.

1. Para se desconstituir o édito repressivo como pretendido no writ seria necessário o exame aprofundado de provas, providência inadmissível na via estreita do habeas corpus, mormente pelo fato de que vigora no processo penal brasileiro o princípio do livre convencimento, em que o julgador pode decidir pela condenação, desde que fundamentadamente.

2. Conforme entendimento desta Corte, o depoimento de policiais responsáveis pela prisão em flagrante do acusado constitui meio de prova idôneo a embasar o édito condenatório, mormente quando corroborado em Juízo, no âmbito do devido processo legal.

3. Ordem denegada.” (HC 223.715/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, Dje de 15.02.2012)

C – No processo penal, a prova emprestada tem sido admitida pela jurisprudência, desde que, no processo de origem dos elementos apresentados, tenha havido participação da defesa técnica do réu e desde que não seja o único dado a embasar a motivação da decisão. CORRETO.

Entendimento pacificado do STJ, a teor do HC 47.311/SP (Rel. Min. Og Fernandes, Dje de 22.03.2010):

“HABEAS CORPUS. CONDENAÇÃO POR TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. SENTENÇA E ACÓRDÃO FUNDAMENTADOS. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DECORRENTE DA UTILIZAÇÃO DE PROVA EMPRESTADA. IMPROCEDÊNCIA. EXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO PRODUZIDOS NO PROCESSO.

1. Ao contrário do que sustenta o impetrante, a extensa sentença condenatória está amparada em farto conjunto probatório produzido sob o crivo do contraditório, não prosperando a alegação de que estaria baseada unicamente em prova emprestada.

2. A leitura do acórdão revela que a condenação está devida e fundamentadamente amparada em provas colhidas na respectiva ação penal, atestando-se a existência de uma organização criminosa voltada à exploração do alto narcotráfico, por meio, principalmente, da utilização de aeronaves destinadas ao transporte da droga, inclusive em âmbito internacional, configurando-se claramente a prática dos crimes de tráfico e associação para o tráfico de drogas.

3. Não se olvide que esta Corte tem se manifestado pela admissibilidade da prova emprestada quando agregada a outros elementos de convicção produzidos no processo, sob o crivo do contraditório.

4. Ordem denegada.”

D – Vítima do delito de lesão corporal incapacitada para as ocupações habituais por mais de trinta dias deve submeter-se a exame pericial logo que decorra esse prazo, contado da data do crime, dado o caráter peremptório do prazo. INCORRETO.

A jurisprudência tem-se inclinado por aceitar o caráter não-peremptório do prazo de 30 dias após o crime para a realização do exame complementar em caso de lesão corporal grave. A esse respeito, confira-se o seguinte julgado:

“PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. LESÃO CORPORAL GRAVE. (1) DOSIMETRIA. PENA BASE. INCREMENTO EXCESSIVO. MOTIVAÇÃO EM PARTE GENÉRICA. ILEGALIDADE RECONHECIDA. PENA REDIMENSIONADA. (2) REGIME ABERTO. REINCIDÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. (3) LAUDO COMPLEMENTAR. REALIZAÇÃO SEIS MESES APÓS O PRIMEIRO EXAME. INCAPACIDADE PARA OCUPAÇÕES HABITUAIS. RECONHECIMENTO. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA.

1. A fixação da pena é uma operação lógica, formalmente estruturada, sendo imperioso promover-se a fundamentação em todas as suas etapas. A referência genérica aos termos da lei ou a fórmulas desligadas do contexto fático espelhado nos autos não autorizam a exasperação da reprimenda penal. Diante da reincidência, é inviável a fixação do regime inicial aberto.

2. O laudo complementar, peça indispensável para o reconhecimento da gravidade da lesão corporal qualificada pela incapacidade para o exercício de ocupações habituais, elaborado seis meses após a primeira perícia não inquina tout court de nulidade a respectiva circunstância.

3. Ordem concedida, em parte, para redimensionar a reprimenda corporal, aplicada nos autos da ação penal n. 005.02.059910-7, da Vara Criminal da Comarca de Aquidauana/MS, para 1 ano, 4 meses e vinte dias de reclusão, mantida, no mais a sentença condenatória.”

E – Caso a confissão do réu, no bojo do inquérito policial, seja utilizada como prova para a condenação na ação penal, é obrigatória a sua consideração como circunstância atenuante na segunda fase de aplicação da pena, exceto se houver retratação em juízo. INCORRETO.

A retratação em juízo não é óbice ao reconhecimento da confissão espontânea realizada em sede de inquérito policial, donde exsurge o equívoco da assertiva.

Confira-se, a respeito, o seguinte aresto:

“PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO ART. 59 DO CP. OCORRÊNCIA. MAUS ANTECEDENTES E REINCIDÊNCIA VALORADOS DIANTE DA MESMA OCORRÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 241/STJ. AÇÕES EM CURSO CONSIDERADAS COMO MAUS ANTECEDENTES, CONDUTA SOCIAL DESREGRADA E PERSONALIDADE NEGATIVA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 444/STJ. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS APTOS A LASTREAR A CONSIDERAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS COMO DESFAVORÁVEIS. DADOS INERENTES AO TIPO PENAL. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. VIOLAÇÃO AO ART. 65, III, D, DO CP. OCORRÊNCIA. CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL RETRATADA EM JUÍZO. EFETIVA UTILIZAÇÃO NA SENTENÇA CONDENATÓRIA COMO PARTE DA FUNDAMENTAÇÃO. INCIDÊNCIA DA ATENUANTE QUE SE FAZ IMPERATIVA. COMPENSAÇÃO COM A REINCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS PREPONDERANTES DO ART. 67 DO CP. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO. CONSEQUENTE OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE QUE SE DECLARA.

(...)

5. Deve ser reconhecida a atenuante da confissão espontânea, prevista no artigo 65, inciso III, alínea d, do Código Penal, ainda que haja retratação em juízo, quando o juiz se vale dela para formar seu convencimento.

6. A Sexta Turma desta Corte tem entendido que a atenuante da confissão espontânea, por envolver a personalidade do agente, também é preponderante, nos termos do artigo 67 do Código Penal, devendo, portanto, ser compensada com a agravante da reincidência.

7. Recurso especial a que se dá provimento, para reconhecer a violação aos artigos 59 e 65, inciso III, alínea d, do Código Penal, redimensionando, dessa forma, a pena do recorrente e, consequentemente, declarando a extinção da punibilidade, pela prescrição da pretensão punitiva do Estado com base na pena aplicada em concreto, nos termos dos artigos 107, inciso IV, combinado com o artigo 109, inciso V, ambos do Código Penal.”

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