5) (FCC – Analista Judiciário – Área Judiciária - TRF 4ª Região - 2010) Em matéria de responsabilidade civil da Administração Pública, é correto afirmar:
(A) A responsabilidade civil prevista constitucionalmente, seja por ação ou por omissão, está fundada na Teoria do Risco Integral.
(B) Os atos jurisdicionais são absolutamente isentos de responsabilidade civil.
(C) A responsabilidade civil da Administração é do tipo subjetiva se o dano causado decorre só pelo fato ou por má execução da obra.
(D) Os atos legislativos, em regra, não acarretam responsabilidade extracontratual do Estado.
(E) A reparação do dano causado pela Administração ao particular deve ser sempre por meio judicial, vedada a forma amigável.
Gabarito: D
COMENTÁRIOS (Rafael de Jesus)
(A) INCORRETA. Reportando-nos aos comentários anteriormente expendidos na questão 5 do 4º Simulado de Direito Administrativo de 2011, a teoria do risco integral não encontra amparo no ordenamento jurídico brasileiro, sendo considerada um exagero pela doutrina administrativa. Ela consiste numa formulação a respeito da responsabilidade estatal segundo a qual todo e qualquer prejuízo que adviesse ao cidadão deveria ser reparado pelo Estado - mesmo nos casos de culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro ou fortuito externo -, o qual funcionaria como um segurador universal. Parte da idéia de que os prejuízos devem ser repartidos por toda a sociedade.
Na verdade, a Constituição Federal de 1988 adotou a teoria do risco administrativo, que impõe ao Estado a responsabilidade pelos riscos criados pelas atividades administrativas. No entanto, não deve o Estado funcionar como um segurador universal, pois ele somente irá responder se configurados os requisitos básicos da responsabilidade objetiva, quais sejam: conduta, nexo de causalidade e resultado danoso. É o que se extrai do § 6º do art. 37 da CF:
“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.
Logo, a responsabilidade civil do Estado prevista constitucionalmente está fundada na teoria do risco administrativo, e não na teoria do risco integral.
(B) INCORRETA. O supratranscrito art. 37, § 6º, da CF trata da responsabilidade civil aplicável a toda a Administração Pública, inclusive ao Poder Judiciário quanto no exercício de atividade administrativa. Entretanto, quando se trata de atos jurisdicionais, a disciplina da responsabilização civil é diversa, pois não seria razoável adotar como regra a responsabilização objetiva do Estado por todos os erros eventualmente cometidos nas decisões jurisdicionais. Isso porque é impossível exercer a jurisdição sem eventuais erros, pois a justiça não é infalível, razão pela qual existem mecanismos processuais de correção de erros, com a previsão de uma série de recursos aptos a submeterem a análise das questões às instâncias superiores. Assim, não se há de responsabilizar o Estado indiscriminadamente por erros judiciais involuntários.
A bem da verdade, a responsabilidade do Estado por erros judiciais involuntários encontra suporte em hipóteses específicas, como as delineadas no inciso LXXV do art. 5º da CF: “o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”. Nesse caso, a proteção constitucional à liberdade dos indivíduos é associada de tal maneira à dignidade humana que o legislador constituinte optou por responsabilizar o Estado por erro judiciário que importe na privação de liberdade do indivíduo, ainda que involuntariamente cometido.
Desse modo, os atos jurisdicionais típicos não são completamente isentos de responsabilidade, desde que haja previsão legal para tanto. Nesse sentido, confira-se o seguinte precedente do STF:
“ERRO JUDICIÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. DIREITO À INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DECORRENTES DE CONDENAÇÃO DESCONSTITUÍDA EM REVISÃO CRIMINAL E DE PRISÃO PREVENTIVA. CF, ART. 5º, LXXV. C.PR.PENAL, ART. 630.
1. O direito à indenização da vítima de erro judiciário e daquela presa além do tempo devido, previsto no art. 5º, LXXV, da Constituição, já era previsto no art. 630 do C. Pr. Penal, com a exceção do caso de ação penal privada e só uma hipótese de exoneração, quando para a condenação tivesse contribuído o próprio réu.
2. A regra constitucional não veio para aditar pressupostos subjetivos à regra geral da responsabilidade fundada no risco administrativo, conforme o art. 37, § 6º, da Lei Fundamental: a partir do entendimento consolidado de que a regra geral é a irresponsabilidade civil do Estado por atos de jurisdição, estabelece que, naqueles casos, a indenização é uma garantia individual e, manifestamente, não a submete à exigência de dolo ou culpa do magistrado.
3. O art. 5º, LXXV, da Constituição: é uma garantia, um mínimo, que nem impede a lei, nem impede eventuais construções doutrinárias que venham a reconhecer a responsabilidade do Estado em hipóteses que não a de erro judiciário stricto sensu, mas de evidente falta objetiva do serviço público da Justiça.”
(STF - RE 505393, Relator: Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 26/06/2007, DJe-117 de 04-10-2007)
(C) INCORRETA. O dano pelo só fato da obra é aquele ocasionado pela obra em si mesma, como pode ocorrer na construção de galerias pluviais ou de túneis, por exemplo. Já o dano pela má execução deriva de algum erro cometido na construção, o qual não seria decorrência normal do projeto inicial.
Entretanto, essa diferenciação é irrelevante para definir a responsabilidade civil objetiva do Estado em decorrência da execução de obras, pois “se a obra é do Estado e sempre deriva de um ato administrativo de quem ordena a sua execução, não faz sentido deixar de responsabilizá-lo simplesmente porque está sendo executada por um particular”1, até porque o executor da obra atua na qualidade de agente do Estado. A respeito, é antigo o entendimento do STF de que “o dano causado por obra pública gera para a administração a mesma responsabilidade objetiva estabelecida para os serviços públicos, mesmo que seja confiada a empreiteiros particulares” (RE 115370, Relator: Min. Carlos Madeira, Segunda Turma, julgado em 15/03/1988, DJ de 15/04/1988).
(D) CORRETA. A lei caracteriza-se por ser genérica, abstrata e impessoal, de modo que é absolutamente normal que uma norma genérica contrarie alguns interesses e satisfaça a outros. Mas não se pode afirmar que os interesses contrariados pela incidência da lei em um caso concreto gere danos indenizáveis, razão pela qual a regra geral é no sentido da “irresponsabilidade do Estado pelos atos legislativos típicos que preordenam a vida em sociedade”2.
(E) INCORRETA. A reparação dos danos causados pelo Estado aos particulares é um dever estabelecido constitucionalmente (art. 37, § 6º, da CF), de modo que o Estado tem a obrigação de utilizar-se das vias administrativas disponíveis para indenizar o particular amigavelmente. Apenas se isso não for possível, em razão de divergências insuperáveis quanto aos valores da indenização ou à própria configuração da responsabilidade estatal, é que será utilizada a via judicial.
1 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 200.
2 CAVALIERI FILHO, Sergio. Op. cit., p. 215.
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