domingo, 18 de dezembro de 2011

Simulado 6_2011 - Processo Penal - Questão 3 - Comentários

Questão 03

(FCC – MP/CE – Promotor de Justiça – 2011) No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas ao se fixar medida cautelar diversa da prisão, o juiz,

(A) depois de ouvir o infrator, deverá decretar a prisão preventiva.

(B) mediante requerimento do Ministério Público, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, dobrar o valor da fiança, cabendo apenas decretar a prisão preventiva em caso de crime doloso cometido por reincidente.

(C) de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva.

(D) apenas mediante requerimento do Ministério Público poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva.

(E) de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, decretar a prisão temporária por até 60 dias ou, em último caso, decretar a prisão preventiva até o término da instrução criminal.


Gabarito: C


(Comentários – Jorge Farias)


A questão representa importante atenção conferida pela Fundação Carlos Chagas às inovações legislativas, o que exige que o candidato mantenha-se constantemente atualizado e atento, não somente às novas disposições legais, como a toda adaptação interpretativa daí decorrente, seja por parte da doutrina, seja pela jurisprudência.

No caso, a resolução da questão exsurge basicamente da literalidade do CPP, recentemente alterado pela Lei 12.403/2011, que trouxe relevantíssimas inovações sobre prisão, medidas cautelares e liberdade provisória.

A esse respeito, a resposta decorre da dicção expressa do art. 282 do Código de Processo Penal, que assim dispõe em seu § 4º:

Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:

(…)

§ 4o No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único).

Apenas a título elucidativo, cumpre ressaltar que as medidas cautelares diversas da prisão encontram-se elencadas no art. 319 do CPP.

Diante de tais considerações, passa-se à análise das assertivas.


A - depois de ouvir o infrator, deverá decretar a prisão preventiva. FALSO.

Tal entendimento conflita com os princípios da necessidade, da gradação e da progressividade, inerentes à nova sistemática das medidas cautelares, consoante se observa do art. 282 e seus incisos:

Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:

I - necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais;

II - adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.

Portanto, a decretação da preventiva diretamente após o descumprimento de cautelar diversa da prisão, mesmo que antecedida pela oitiva do acusado, atenta contra as disposições do CPP pertinentes à espécie, de modo que a assertiva é FALSA.


B - mediante requerimento do Ministério Público, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, dobrar o valor da fiança, cabendo apenas decretar a prisão preventiva em caso de crime doloso cometido por reincidente. FALSO.

Como visto, o art. 282, § 4º, do CPP nos dá a correta solução para o caso, que não coincide com a proposta da assertiva, sobretudo no que se refere à dobra do valor da fiança, não prevista por aquele dispositivo.

Ademais, a decretação da preventiva não se restringe à hipótese veiculada, mas aplica-se sempre que não for cabível qualquer outra medida cautelar diversa da prisão, nos termos do art. 282, § 6º:

§ 6o A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).

Portanto, incorreta a assertiva.


C - de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva. VERDADEIRO.

Assertiva correta, pois, consoante já demonstrado, reproduz os literais termos do art. 282, § 4º, do CPP, abaixo reiterado apenas para fins mnemônicos:

Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:

(…)

§ 4o No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único).


D - apenas mediante requerimento do Ministério Público poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva. FALSO.

Como visto, a legitimidade para requerer a substituição da medida é concorrente entre Ministério Público, assistente e querelante, além da possibilidade de decretação de ofício.

Portanto, ao se referir à iniciativa exclusiva do MP, é FALSA a assertiva.


E - de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, decretar a prisão temporária por até 60 dias ou, em último caso, decretar a prisão preventiva até o término da instrução criminal. FALSO.

Além das já exaustivas considerações acerca da legitimidade, militam em desfavor da assertiva dois outros elementos: a possibilidade de decretação da prisão temporária e da manutenção da preventiva até o fim da instrução processual penal.

Primeiramente, revela-se incabível o decreto de prisão temporária, não somente por atentar contra a dicção do art. 282, § 4º, do CPP, mas também porque tal modalidade de restrição de liberdade encontra-se estritamente regulada pela Lei 7.960/81, onde constam a respectiva finalidade (prisão necessária para as diligências policiais, e, portanto, cabível somente em fase de inquérito) bem como o prazo (5 ou 30 dias, conforme a hediondez do delito, prorrogáveis por igual período), aspectos que revelam a impertinência da prisão temporária no caso.

Por seu turno, a prisão preventiva segue a cláusula rebus sic stantibus, ou seja, deve-se dar conforme os fatos do momento de sua decretação, de modo que somente se fala em sua manutenção até o fim da instrução criminal se fundamentada na “conveniência da instrução criminal”, prevista no caput do art. 312 do CPP, hipótese diversa do descumprimento de cautelar diversa da prisão, cuja previsão reside no art. 312, parágrafo único. A esse respeito, confira-se:

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4º).

Portanto, FALSA a assertiva.

Um comentário:

  1. Roberto Delmanto e Damásio E. de Jesus divergem deste entendimento. Para eles, o art. 282 deve ser conjugado com o requisito objetivo da pena máxima cominada ser superior a 4 anos de prisão. Do contrário, o descumprimento da medida cautelar implicaria em uma consequência mais gravosa do que o próprio crime em razão do qual se instaurou o processo e se aplicou a medida cautelar, ferindo, assim, o princípio constitucional da proporcionalidade. O que fazer então? Não é indicada uma solução. Mas ouso sugerir que o descumprimento da medida cautelar, neste caso, poderá ser considerada na individualização da pena na hipótese de condenação, e, em outros processos por crimes com pena acima de 4 anos, para indicar que a medida cautelar se revelará inadequada ou insuficiente.

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