terça-feira, 20 de março de 2012

Simulado 9_2012 - Constitucional - Questão 1

(Instituto Cidades/DPE-AM/Defensor Público/2011) A respeito do conceito e da classifcação da Constituição, é correto afirmar que:
a) A Constituição, na clássica definição de Lassalle, é a decisão polítca fundamental de um povo, insculpida em um texto normativo que goza de superioridade jurídica frente às demais normas constitucionais.
b) Para Carl Schimit, a Constituição é a norma jurídica fundamental do ordenamento jurídico, servindo de fundamento de validade para as demais normas jurídicas.
c) No entendimento de Hans Kelsen, a Constituição é resultado das forças reais de poder, buscando o seu fundamento de validade em uma norma jurídica epistemológica
d) Para Carl Schmit, não há razão para se fazer distinção entre normas constitucionais em sentido formal e em sentido material, pois tudo o que está na Constituição tem o mesmo status constitucional.
e) No sentido ontológico (karl Loewenstein), a Constituição pode ser classificada em semântica, nominal e normativa. A Constituição Federal de 1988 é um exemplo de Constituição normativa



Comentários (Arthur Tavares)

Alternativa A. Incorreta. Ferdinand Lassale, em sua obra O que é uma Constituição, foi o expoente do chamado conceito sociológico de Constituição. Para ele, a Constituição somente seria legítima se representasse as forças sociais que constituem o poder. O autor celebrizou a expressão segundo a qual a Constitução é uma mera folha de papel, que deve ser ignorada se não reflete a soma dos fatores reais de poder. Nessa linha, o texto normativo é que deveria se adaptar à realidade fática, e não o contrário.

Já a noção de “decisão política fundamental” é vista no conceito político de Constituição, defendido por Carl Schmitt.

Alternativa B. Incorreta. Como mencionado em relação à assertiva anterior Schmitt defendeu o conceito político de Constituição, segundo o qual esta seria espelharia as decisões políticas fundamentais do titular do poder constituinte.


O referido autor faz a distinção entre normas materialmente constitucionais e leis constitucionais (ou Constituição e lei constitucional). As normas formalmente inseridas no texto constitucional, mas que não refletissem uma decisão política fundamental (tal como direitos individuais, organização do Estado e distribuição dos poderes refletem) seriam meras leis constitucionais, não podendo ser consideradas Constituição.


A percepção de que a Constituição é a norma jurídica fundamental e apresenta superioridade decorre da construções teóricas de Hans Kelsen, com seu conceito jurídico. Para ele, a norma deve ser entendido como puro dever-ser, afastadas quaisquer concepções políticos, filosóficas, sociológicas. Daí porque falava em uma Teoria Pura do Direito (e assim entitulou a sua principal obra). É na teoria do austríaco que surge a necessidade da chamada da compatibilidade vertical (ou verticalidade hierárquica), modelo no qual normas de menor hierarquia devem respeito a normas superiores, nas quais buscam fundamento de validade. Essas noções inspiram o nosso ordenamento atual e são fundamentais para a compreensão do controle de constitucionalidade.

Alternativa C. Incorreta. É possível afirmar que, na teoria Kelseniana, a Constituição busca seu fundamento de validade em uma norma epistemológica. Como se sabe, o conceito jurídico é bipartido: o jurídico-positivo e o lógico-jurídico.

No primeiro, toma-se a Constituição como a norma de mais alta hierarquia de um ordenamento, que serve de fundamento de validade para todas as outras.

No segundo, busca-se uma forma de explicar o que, afinal, confere validade à referida norma de maior hierarquia. Admite-se, então, a existência de uma norma hipotética fundamental, cuja aceitação é pressuposto lógico para que se aceite a superioridade conferida à Constituição.

Assim, a erronia da assertiva reside em afirmar que para Kelsen, a Constituição é resultado das forças de poder. Como vimos, esse é o entendimento de Ferdinand Lassale, em seu conceito sociológico.

Alternativa D. Incorreta. Como vimos acima, no conceito político de Schmitt, há distinção entre Constituição e as chamadas leis constitucionais, de modo que nem tudo que está no texto constitucional tem o mesmo status.

Importante que se tenha atenção para não fazer uma indevida importação de conceitos. O que se expõe é entendimento de Schmitt. Quanto ao ordenamento brasileiro, observe que, apesar de nossa Constituição Federal conter uma grande diversidade de normas que são apenas formalmente - mas mão materialmente - constitucionais, o princípio hermenêutico da unidade impõe que não há diversidade hierárquica no texto, de modo que todas as normas da CF88 têm, sim, o mesmo status.

Alternativa E. Correta. É o nosso gabarito. Importante ressaltar que, para muitos autores, esse não seria um dos sentidos de Constituição, mas uma das classificações possíveis. De qualquer forma, é, sem dúvida, a mais adequada das assertivas.

Na classificação ontológica de karl Lowenstein (que adota um critério referente à correspondência com a realidade, quanto à essência ou, ainda, quanto à efetividade da Constituição), ter-se-iam constituições normativas, nominalistas e semânticas.

A constituição normativa é aquela cujos preceitos são respeitados pelas pessoas e poderes que estão sujeitas à normatividade constitucional. Nela, o processo político submete-se e respeita a previsão do texto.


A constituição semântica é uma espécie de máscara do poder. Apresenta apenas uma aparência de legalidade, mas com a finalidade de legitimar a utilização corrompida dos poderes atribuídos. É, em verdade, feita com a finalidade de ser manipulada e descumprida, sendo comum em regimes ditatoriais. Há pouca ou nenhuma correspondência entre as previsões constitucionais e realidade, de modo que a Constituição somente se aplica conforme a conveniência daquele que exerce o poder.


A constituição nominalista é uma espécie de meio termo entre as duas anteriores. Chama-se nominalista, porque ela atribui direitos e pretende, de fato, regular a sociedade (dá muitos nomes), mas não é efetivamente ou inteiramente respeitada, carecendo, em grande parte, de efetiva aplicabilidade.


Há doutrina de peso a sustentar que nossa Constituição é nominalista (veja-se o exemplo de Uadi Lammêgo Bulos), mas, para a maioria dos doutrinadores, temos, no Brasil, uma constituição normativa. Para fins de provas objetivas, recomendável seguir esse entendimento, que, a propósito, responde à presente questão.

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