Questão 02
(TRT 3ª Região – Juiz do Trabalho – 2012)
Quanto aos denominados crimes de apropriação indébita previdenciária, analise os itens abaixo e assinale o correto:
a) É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons antecedentes, na hipótese de ter promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da contribuição social previdenciária, inclusive acessórios.
b) Esses crimes estão tipificados em lei especial.
c) É extinta a punibilidade se o agente declara e confessa espontaneamente todos os valores sonegados logo no início da ação fiscal.
d) Extingue-se automaticamente a punibilidade quando o agente for primário e de bons antecedentes e quando o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais.
e) O crime não restará configurado se o empregador deixar de pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social.
Gabarito: “A”
(Comentários – Jorge Farias)
Como visto, a questão exige do candidato o conhecimento das diversas disposições pertinentes ao delito de apropriação indébita previdenciária, incluído no Código Penal pela Lei 9.983/2000, que inseriu no estatuto repressivo o art. 168-A, assim redigido:
“Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
§ 1o Nas mesmas penas incorre quem deixar de:
I – recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público;
II – recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços;
III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social.
§ 2o É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal.
§ 3o É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons antecedentes, desde que:
I – tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou
II – o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais.”
Passemos, pois, à análise das assertivas.
a) É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons antecedentes, na hipótese de ter promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da contribuição social previdenciária, inclusive acessórios. CORRETA.
Trata-se de reprodução literal do § 3º, inciso I, acima transcrito.
Convém ressaltar, entretanto, que, por se tratar de crime material, há precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça estendendo o entendimento consolidado na Súmula Vinculante nº 24 (“Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”) também à apropriação indébita previdenciária:
“HABEAS CORPUS. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS E APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA (ARTIGOS 337-A E 168-A DO CÓDIGO PENAL). INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL. AUSÊNCIA DE CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DAS EXAÇÕES NO ÂMBITO ADMINISTRATIVO. FALTA DE JUSTA CAUSA PARA A PERSECUÇÃO PENAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. CONCESSÃO DA ORDEM.
1. Segundo entendimento adotado por esta Corte Superior de Justiça, os crimes de sonegação de contribuição previdenciária e apropriação indébita previdenciária, por se tratarem de delitos de caráter material, somente se configuram após a constituição definitiva, no âmbito administrativo, das exações que são objeto das condutas (Precedentes).
2. Conforme se infere dos documentos acostados à impetração, bem como em consulta ao sítio do Ministério da Fazenda, os processos administrativos em que se questionam as notificações fiscais de lançamentos de débito que deram origem ao presente inquérito policial ainda estão em andamento, não havendo, por conseguinte, o lançamento definitivo dos débitos fiscais, pelo que inexiste justa causa para a persecução penal.
3. Ordem concedida para trancar o inquérito policial instaurado contra o paciente.”
(HC 137.761/MS, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 14.02.2011)
Portanto, embora a assertiva esteja plenamente correta à luz do Código Penal, deve ser interpretada com os temperamentos que lhe vem sendo conferidos pela jurisprudência, no sentido de considerar não haver sequer a justa causa para a ação penal antes de exaurida a instância administrativa para a constituição do crédito.
Ou seja, efetuado o pagamento integral do débito e de seus acessórios enquanto não esgotada a instância administrativa, sequer caberia falar na aplicação do instituto previsto no art. 168-A, § 3º, inciso I, do Código Penal.
b) Esses crimes estão tipificados em lei especial. INCORRETA.
Como visto, os delitos de apropriação indébita previdenciária estão tipificados no art. 168-A, caput e § 1º, do Código Penal.
c) É extinta a punibilidade se o agente declara e confessa espontaneamente todos os valores sonegados logo no início da ação fiscal. INCORRETA.
A denúncia espontânea caracteriza-se pela sua realização antes do início da ação fiscal, tal como previsto no § 2º acima transcrito.
d) Extingue-se automaticamente a punibilidade quando o agente for primário e de bons antecedentes e quando o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais. INCORRETA.
A assertiva confere interpretação equivocada ao § 3º e seu inciso II, na medida em que não há extinção automática da punibilidade (que, acaso existente, dependeria de sentença judicial declaratória), mas apenas o perdão judicial ou a aplicação somente da pena de multa.
Importante salientar respeitável corrente doutrinária que entende ser o caso de aplicação do princípio da insignificância e não do perdão judicial, uma vez que aquela solução é mais benéfica ao réu, nos seguintes termos:
“O Superior Tribunal de Justiça já decidiu a esse respeito, favoravelmente ao reconhecimento da atipicidade da conduta: 'Constatando-se que a importância que deixou de ser recolhida aos cofres do INSS é inferior ao patamar estabelecido no dispositivo legal que determinou a extinção dos crédito oriundos de contribuições sociais, correta a aplicação do princípio da insignificância' (Resp 261.403/SC, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, DJ 04.02.2002)
Essa discussão não se restringe ao círculo acadêmico, sendo óbvio seu interesse prático. Isto porque, se aplicadas a disposições do § 3º do artigo 168-A, com a concessão do perdão judicial, haverá uma sentença em que o juiz reconhece a culpa, isto é, considera a repercussão social negativa da conduta, mas decide que, objetivamente, a aplicação da pena é desnecessária. No entanto, se reconhecida a insignificância do valor indevidamente apropriado, o juiz não irá atestar a existência das circunstâncias objetivas e subjetivas que integram o delito, mas, sim, a atipicidade do fato”1.
e) O crime não restará configurado se o empregador deixar de pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social. INCORRETA.
Trata-se de conduta típica, capitulada no art. 168-A, § 1º, inciso III, do CP, acima transcrito.
1CUNHA, Rogério Sanches. CP para concursos. Salvador: Juspodium, 2010. 3. ed. p. 339.
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