domingo, 18 de março de 2012

Simulado 8_2012 - Penal e Processo Penal - Questão 1

Prezados,

Seguem os comentários às questões de Penal e Processo Penal disponibilizadas ontem, em conjunto.

Fraternal abraço e boa semana de estudos.


Questão 01

(TRT 3ª Região – Juiz do Trabalho – 2012)

Considerando a Lei 4898 de 1965 que trata do crime de abuso de autoridade, analise as afirmativas abaixo e assinale a incorreta:

a) Constitui abuso de autoridade qualquer atentado, praticado por funcionário público, a incolumidade física do indivíduo.

b) O abuso de autoridade sujeita o criminoso à responsabilidade civil, administrativa e penal, todas tratadas inclusive pela lei 4.898/65.

c) Levar à prisão e nela deter quem quer que se proponha a prestar fiança, permitida em lei, constitui crime de abuso de autoridade.

d) Ordenar ou executar medida privativa de liberdade, com as formalidades legais, constitui abuso de autoridade.

e) A sanção penal poderá constituir na perda do cargo e na inabilitação para o exercício de qualquer outra função por prazo até três anos.


Gabarito: “D”


(Comentários – Jorge Farias)


Inicialmente, cumpre ressaltar que a Lei do Crime de Abuso de Autoridade é tema frequentemente cobrado em concursos públicos, embora, geralmente, os questionamentos não ultrapassem a mera literalidade da lei, o que exige redobrada atenção do nosso leitor para cada detalhe, por mais sutil que possa parecer, mas potencialmente determinante para lograr acertar a questão.

No presente caso, não é diferente, consoante se observará da análise das assertivas.

Note-se que o enunciado exige que se aponte a assertiva INCORRETA.


a) Constitui abuso de autoridade qualquer atentado, praticado por funcionário público, à incolumidade física do indivíduo. CORRETA.

Trata-se de hipótese expressamente prevista no art. 3º, alínea “i”, da Lei 4.898/65.

Atenção! Basta que ocorra o atentado à incolumidade física para que se configure o crime, não sendo necessária a efetiva lesão à integridade da vítima, o que torna, em tese, o delito insuscetível à modalidade tentada, na medida em que se trata de crime formal ou de consumação antecipada.

Importante destacar que, segundo o STF, o delito em tela não revogou tacitamente o crime de violência arbitrária do art. 322 do CP (RHC 95617/MG).

Por fim, convém salientar que não há óbice à configuração de concurso desse crime com o de lesão corporal, dado protegerem objetos jurídicos diversos.


b) O abuso de autoridade sujeita o criminoso à responsabilidade civil, administrativa e penal, todas tratadas inclusive pela lei 4.898/65. CORRETA.

O abuso de autoridade sujeita o infrator à responsabilização nas três esferas: administrativa, cível e penal, consoante previsão expressa dos arts. 1º e 6º da Lei:

Art. 1º O direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa civil e penal, contra as autoridades que, no exercício de suas funções, cometerem abusos, são regulados pela presente lei.

Art. 6º O abuso de autoridade sujeitará o seu autor à sanção administrativa civil e penal.”

Especificamente sobre a responsabilização em cada esfera, assim dispõe a Lei 4.898/65:

§ 1º A sanção administrativa será aplicada de acordo com a gravidade do abuso cometido e consistirá em:

a) advertência;

b) repreensão;

c) suspensão do cargo, função ou posto por prazo de cinco a cento e oitenta dias, com perda de vencimentos e vantagens;

d) destituição de função;

e) demissão;

f) demissão, a bem do serviço público.


§ 2º A sanção civil, caso não seja possível fixar o valor do dano, consistirá no pagamento de uma indenização de quinhentos a dez mil cruzeiros.


§ 3º A sanção penal será aplicada de acordo com as regras dos artigos 42 a 56 do Código Penal e consistirá em:

a) multa de cem a cinco mil cruzeiros;

b) detenção por dez dias a seis meses;

c) perda do cargo e a inabilitação para o exercício de qualquer outra função pública por prazo até três anos.


§ 4º As penas previstas no parágrafo anterior poderão ser aplicadas autônoma ou cumulativamente.


§ 5º Quando o abuso for cometido por agente de autoridade policial, civil ou militar, de qualquer categoria, poderá ser cominada a pena autônoma ou acessória, de não poder o acusado exercer funções de natureza policial ou militar no município da culpa, por prazo de um a cinco anos.”


c) Levar à prisão e nela deter quem quer que se proponha a prestar fiança, permitida em lei, constitui crime de abuso de autoridade. CORRETA.

Trata-se de outra hipótese expressamente prevista na Lei 4.898/65, mais precisamente em seu art. 4º, alínea “e”.

Trata-se da violação ao direito de fiança do preso, objeto das recentes alterações introduzidas pela Lei 12.403/2011, já aqui objeto de análise em diversas oportunidades, mas cuja importância recomenda nova transcrição dos dispositivos pertinentes do CPP:

Art. 322. A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos.

Parágrafo único. Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas.


Art. 323. Não será concedida fiança:

I - nos crimes de racismo;

II - nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos;

III - nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;


Art. 324. Não será, igualmente, concedida fiança:

I - aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 deste Código;

II - em caso de prisão civil ou militar;

III - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011);

IV - quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312).”


d) Ordenar ou executar medida privativa de liberdade, com as formalidades legais, constitui abuso de autoridade. INCORRETA.

Esta a assertiva a ser assinalada, diante da sua manifesta incorreção por contrariedade à expressa previsão da Lei 4.868/65:

Art. 4º Constitui também abuso de autoridade:

a) ordenar ou executar medida privativa da liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder”

Como exemplos, podemos citar a prisão em flagrante sem a lavratura de APF ou o uso de algemas sem a observância à Súmula Vinculante nº 11-STF.

Note-se que a modalidade “ordenar” é crime formal, admitindo a tentativa somente na forma escrita. Por outro lado, o tipo “executar” é material, sendo plenamente possível a tentativa.

Atenção para o caso de apreender criança ou adolescente sem flagrante de ato infracional e sem ordem judicial. Esta conduta configura o crime do art. 230 do ECA, norma prevalecente em razão do princípio da especialidade e da proteção à criança e ao adolescente, ante a maior severidade da pena cominada no ECA.


e) A sanção penal poderá constituir na perda do cargo e na inabilitação para o exercício de qualquer outra função por prazo até três anos. CORRETA.

Como visto nos comentários à assertiva “b”, além das penas de multa e privativa de liberdade (detenção por dez dias a seis meses), há também a perda do cargo e a inabilitação para o exercício de qualquer outra função pública por prazo até três anos.

Atenção para o caso específico de abuso de autoridade cometido por policial, também objeto da sanção, autônoma ou acessória, de não poder o acusado exercer funções de natureza policial ou militar no município da culpa, por prazo de um a cinco anos.

2 comentários:

  1. Se formos analisar ao "pé da letra", acho que a alternativa "E" também está errada. A Lei diz: Art. 6º _ parágrafo 3º _ alínea c: "perda do cargo e a inabilitação para o exercício de qualquer outra função pública por prazo até três anos". Observe que a qualificação "pública" não aparece na alternativa "E". Com certeza alguém que errou esta questão pode entrar com recurso para anulá-la.

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