segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Simulado 4_Processo Civil - 1º Ciclo - Questão 1 - Comentários


Prezados amigos,
seguem os comentários das 9 questões de nosso 4º Simulado de Processo Civil. Estamos devendo o 2º e 3º Simulados. Pretendemos publicá-los nas próximas semanas.
Bons Estudos !!! 

Questão 1
(MPE/GO - Promotor de Justiça – 2009)
Das teorias sobre a natureza jurídica da ação é correto afirmar:
A) A teoria civilista de Savigny considera que o direito de ação tem autonomia em relação ao direito material.
B) A teoria do direito concreto (Bullow e Wach) não reconhece a autonomia do direito processual em relação ao direito material, de maneira que para a mesma tais direitos se identificam no exercitamento da pretensão.
C) Para Enrico Tulio Liebman ( teoria eclética), o direito de ação tem dois aspectos, o direito de demanda ou de acesso ou petição (incondicionado) e o direito de ação propriamente dito, que exige o preenchimento de condições a viabilizar o julgamento efetivo da pretensão deduzida.
D) A teoria do direito abstrato (Degenkolb e Plósz) preconiza que somente terá havido o exercício da ação se a tutela jurisdicional invocada for concedida.

Gabarito: LETRA C

Comentários (Rafael Câmara)

Existem várias teorias a respeito da natureza jurídica da ação. Algumas delas estão superadas, havendo apenas interesse histórico. Outras, todavia, têm valor atual, porquanto há, ainda, viva polêmica a respeito da melhor teoria sobre o direito de ação. Passemos a descrever sucintamente as principias teorias sobre o tema.

TEORIA IMANENTISTA ou CIVILISTA

A ação seria o próprio direito material em movimento, reagindo a uma agressão ou a uma ameaça de agressão (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manual de Direito Processual Civil, Ed. Método, 1ª edição, pág. 71). Para a teoria imanentista, não havia autonomia entre o direito material e o direito processual, ou seja, a ação não era colocada em um plano distinto do plano de direito material. A ação nada mais era do que uma face do direito material. Para essa teoria, não existiria ação sem existir direito material. A ação seria um poder que o indivíduo possui contra o seu adversário e não contra o Estado.
É essa a teoria defendida por Savigny e que teve entre seus adeptos, no Brasil, Clóvis Beviláqua.
A partir da polêmica travada entre Windscheid e Muther, a teoria imanentista (ou civilista) restou superada. O direito de ação passou a ser visto como um direito autônomo em relação ao direito material.

TEORIA CONCRETA DA AÇÃO

Criada pelo jurista alemão Adoph Wach, foi a primeira teoria a fazer a distinção entre o direito material e o direito de ação. A teoria concreta da ação defende a ação como um direito autônomo, distinto da relação de direito material. Embora Wach defendesse a autonomia do direito de ação, negava a sua completa independência, pois entendia que o direito de ação só existiria se o autor fosse titular do direito material.
Já Bullow descreveu uma concepção da natureza da ação muito próxima da teoria de Wach, apenas diferenciando porque, para Bullow, a ação apenas existiria diante de uma sentença justa.
A teoria concreta unia elementos de direito material e processual. A pretensão à tutela jurídica se voltava tanto contra o Estado quanto contra o adversário. Segundo leciona o Professor Daniel Amorim Assumpção Neves:
“Apesar do avanço quando comparada com a teoria imanentista, a teoria concreta defende que o direito de ação só existe se o direito material existir, condicionando a existência do primeiro à existência do segundo. Reconhece-se a autonomia do direito de ação, mas não a sua independência, considerando que o direito de ação dependeria do direito material” (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manual de Direito Processual Civil, Editora Método, 1ª edição, pág. 72).
Essa teria também está superada.

TEORIA ABSTRATA DA AÇÃO

Também chamada de teoria do direito abstrato de ação, foi criada por Degenkolb e Plósz. Para essa teoria, o direito material não se confunde com o direito de ação. Da mesma forma que a teoria concreta, a teoria abstrata da ação mantém a autonomia entre o direito material e o direito de ação, mas vai além ao afirmar que o direito de ação é independente do direito material. Assim, pode haver direito de ação mesmo que não haja direito material.
Para essa teoria, o direito de ação seria o direito abstrato de obter um pronunciamento do Estado, por meio da decisão judicial, seja qual for o conteúdo dessa decisão. Nesse sentido, eventual sentença de improcedência, mesmo negando a existência do direito material, não retiraria o do direito de ação do autor.
Portanto, o direito de ação seria abstrato, amplo, genérico e incondicionado, pois não haveria nenhum requisito que precisasse ser preenchido para a sua existência. Não haveria nenhuma condição para o exercício do direito de ação. O direito material, para a teoria abstrata, seria absolutamente irrelevante para a existência do direito de ação. Ou seja, o direito de ação existiria pelo simples fato de o Estado-Juiz ter sido provocado a atuar, ainda que seja para negar o direito do autor (Alexandre Freitas Câmara, Lições de Direito Processual Civil, editora Lumen Juris, 16ª edição, pág. 122).
Nas lições do professor Daniel Amorim Assumpção Neves:
“Essa característica de ser o direito de ação incondicionado leva os abstrativistas puros a rejeitar a existência das condições da ação consagrada em nosso ordenamento processual. Para essa corrente de pensamento, o termo carência de ação não existe, porque não existe nenhuma condição para o exercício do direito de ação, sendo que as chamadas “condições da ação” – possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimidade – são na realidade matéria de mérito (...)”. (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manual de Direito Processual Civil, Ed. Método, Editora Método, 1ª edição, pág. 74).
Assim, para a corrente de pensamento ora estudada, toda sentença seria uma decisão de mérito, de forma que, após o trânsito em julgado, estaria protegida pelo fenômeno da coisa julgada material.
Essa teoria tem relevância na atualidade. Muitos doutrinadores defendem-na como a mais correta academicamente e mais condizente com o princípio da economia processual, pois evitaria a repropositura de demandas já rejeitadas.

TEORIA ECLÉTICA DA AÇÃO

A teoria eclética da ação é a adotada pelo nosso Código de Processo Civil. Seu principal teórico foi o italiano Enrico Tullio Liebman. Para essa corrente de pensamento, o direito de ação seria abstrato, autônomo em relação ao direito material. Da mesma forma que a teoria abstrata, a teoria eclética defende a existência do direito de ação ainda que o demandante não seja titular do direito material invocado.
A diferença entre a teoria eclética e a teoria abstrata reside no fato de que a teoria eclética considera que o exercício da ação deve preencher alguns requisitos, os quais Liebman denominou de condições da ação. Pode-se afirmar que a teoria eclética da ação constitui a teoria abstrata com temperamentos.
Para a teoria ora examinada, o direito da ação seria o direito a um julgamento de mérito, pouco importando se a decisão foi favorável ou desfavorável ao autor. Mas o julgamento de mérito só ocorreria quando preenchidos alguns requisitos (condições da ação), quais sejam: a) possibilidade jurídica do pedido; b) legitimidade e c) interesse de agir.
Na hipótese de o autor não preencher um dos requisitos, o processo se encerraria sem a apreciação da pretensão deduzida em juízo (mérito).
Mais uma vez, tomemos as lições do professor Daniel Amorim Assumpção Neves, que muito bem esclarece as principais características dessa teoria:
“A teoria eclética defende que a existência do direito de ação não depende da existência do direito material, mas do preenchimento de certos requisitos formais chamados de ‘condições da ação’. Para essa teoria, as condições da ação não se confundem com o mérito, sendo analisadas preliminarmente e, quando ausentes, geram uma sentença terminativa de carência de ação (art. 267, VI, do CPC) sem a formação da coisa julgada material. Tratando-se de matéria de ordem pública não há preclusão, entendendo os defensores da teoria eclética que a qualquer momento do processo e com qualquer grau de cognição do juiz deve extinguir o processo sem resolução de mérito por carência de ação se entender ausente uma das condições da ação”. (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manual de Direito Processual Civil, Editora Método, 1ª edição, pág. 74).
Questão delicada para a teoria eclética é explicar como uma sentença que extingue o processo, reconhecendo a carência da ação, por ausência de umas de suas condições, não seria manifestação do direito de ação. Ora, havendo uma resposta do Juiz, ainda que para extinguir o
processo sem resolução do mérito, não teria havido o exercício do direito de ação? Como se poderia afirmar que não houve o exercício da ação se o Estado-Juiz foi provocado e respondeu à provocação?
Para responder a essa questão, Liebman faz uma distinção entre direito de petição e direito de ação. O direito de petição consistiria no direito a obter uma manifestação de qualquer órgão público, entre eles o Judiciário. Já o direito de ação consubstanciaria o direito a uma sentença de mérito. Assim, o direito de petição seria amplo, genérico e incondicional, mas o direito de ação seria condicionado. Logo, nas hipóteses em que não fossem preenchidas as condições da ação, haveria mero exercício do direito de petição e não do direito de ação.
Para facilitar a memorização pelo Candidato, concentramos as principais características de cada teoria no seguinte quadro sinótico:

QUADRO SINÓTICO

- Teoria Imenentista ou Civilista
* Savigny e Clóvis Beviláqua;
* Não há autonomia entre direito de ação e o direito material;
* É o próprio direito material em movimento;
* Só há ação se houver o direito material;
* A ação é dirigida contra o adversário;
* Essa teoria está superada.

- Teoria Concreta
* Adoph Wach e Bullow
* Distinção entre direito material e direito de ação;
* Direito de ação é autônomo, mas dependente do direito material;
* Só há direito de ação se houver direito material;
* A ação se volta contra o Estado e contra o adversário;
* A ação seria um direito autônomo, público e concreto;
* Está superada.

- Teoria Abstrata
* Degenkolb e Plósz;
* Autonomia entre o direito material e o direito de ação;
* Direito de ação é independente do direito material;
* Pode haver direito de ação mesmo que não haja direito material;
* Direito de ação é o direito abstrato de obter um pronunciamento do Estado, seja qual for o conteúdo dessa decisão;
* Abstrato, amplo, genérico e incondicionado;
* Não há nenhuma condição para o exercício do direito de ação;
* Toda sentença seria uma decisão de mérito;
* A ação é dirigida contra o Estado;
* Relevância atual.

- Teoria Eclética
* Liebman
* Adotada pelo CPC;
* Direto de ação seria abstrato, autônomo em relação ao direito material;
* direito da ação como direito a um julgamento de mérito;
* Teoria abstrata + condições da ação;
* Necessidade de preencher as condições da ação: a) Possibilidade jurídica do pedido; legitimidade; interesse de agir;
* Ausente uma das condições da ação, o processo se encerrara sem a apreciação do mérito (não forma coisa julgada material);
* Condições da ação são questões de ordem pública. Podem ser conhecidas a qualquer momento do processo e em qualquer grau de jurisdição;
* Distinção entre direito de petição (incondicionado) e direito de ação (condicionado);
* Ação contra o Estado-Juiz;
* Relevância atual.

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