Questão 03
(FCC – DPE/SP – Defensor
Público – 2012)
Analise as assertivas abaixo.
I. O civilmente identificado,
indiciado pela prática de homicídio qualificado, deverá ser
criminalmente identificado pela autoridade policial.
II. A decisão judicial de
arquivamento do inquérito policial com fundamento na atipicidade do
fato praticado produz coisa julgada material, impedindo-se a
reabertura das investigações preliminares mesmo diante do
surgimento de novas provas.
III. É direito do defensor, no
interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova
que, já documentados em procedimento investigatório realizado por
órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao
exercício do direito de defesa.
IV. Nos termos da orientação já
sumulada pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de execução penal a
falta de defesa técnica por defensor no processo administrativo
disciplinar não ofende a Constituição Federal.
Está correto APENAS o que se afirma
em
(A) I e II.
(B) II e III.
(C) III e IV.
(D) I, II e III.
(E) II, III e IV.
Gabarito: “B”
(Comentários – Jorge Farias)
Trata-se de questão que abordou uma
série de conhecimentos sobre diversos temas de direito processual
penal, tanto de índole constitucional quanto infraconstitucional.
Desse modo, passemos diretamente à
análise das assertivas:
I. O civilmente identificado,
indiciado pela prática de homicídio qualificado, deverá ser
criminalmente identificado pela autoridade policial. INCORRETO.
Trata-se de afirmação frontalmente
conflitante com a normatização pertinente, qual seja:
CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Art. 5º (omissis)
LVIII - o civilmente identificado
não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses
previstas em lei
Lei 12.037/2009
Art. 3º Embora apresentado
documento de identificação, poderá ocorrer identificação
criminal quando:
I – o documento apresentar rasura
ou tiver indício de falsificação;
II – o documento apresentado for
insuficiente para identificar cabalmente o indiciado;
III – o indiciado portar
documentos de identidade distintos, com informações conflitantes
entre si;
IV – a identificação criminal
for essencial às investigações policiais, segundo despacho da
autoridade judiciária competente, que decidirá de ofício ou
mediante representação da autoridade policial, do Ministério
Público ou da defesa;
V – constar de registros policiais
o uso de outros nomes ou diferentes qualificações;
VI – o estado de conservação ou
a distância temporal ou da localidade da expedição do documento
apresentado impossibilite a completa identificação dos caracteres
essenciais.
Parágrafo único. As cópias dos
documentos apresentados deverão ser juntadas aos autos do inquérito,
ou outra forma de investigação, ainda que consideradas
insuficientes para identificar o indiciado.
Portanto, ao menos nos termos da
legislação ora vigente, não se procede à identificação criminal
do civilmente identificado, tão somente por ter sido indiciado pela
prática de homicídio qualificado, devendo ocorrer alguma das
hipóteses elencadas no art. 3º da Lei 12.037/2009.
Mas atenção para a recente
alteração legislativa promovida pela Lei 12.654, de 28 de maio de
2012, que passou a prever a coleta de perfil genético como forma de
identificação criminal, acrescendo o art. 9º-A à Lei
12.037/2009:
“Art. 9o-A. Os condenados por
crime praticado, dolosamente, com violência de natureza grave contra
pessoa, ou por qualquer dos crimes previstos no art. 1o da Lei no
8.072, de 25 de julho de 1990, serão submetidos, obrigatoriamente, à
identificação do perfil genético, mediante extração de DNA -
ácido desoxirribonucleico, por técnica adequada e indolor.
§ 1o A identificação do perfil
genético será armazenada em banco de dados sigiloso, conforme
regulamento a ser expedido pelo Poder Executivo.
§ 2o A autoridade policial,
federal ou estadual, poderá requerer ao juiz competente, no caso de
inquérito instaurado, o acesso ao banco de dados de identificação
de perfil genético.”
Saliente-se que as alterações
promovidas pela referida lei ainda se encontram em vacatio legis,
passando a vigorar a partir de 28/11/2012, ou seja, 180 dias após
sua publicação.
II. A decisão judicial de
arquivamento do inquérito policial com fundamento na atipicidade do
fato praticado produz coisa julgada material, impedindo-se a
reabertura das investigações preliminares mesmo diante do
surgimento de novas provas. CORRETO.
Trata-se da conjugação de
entendimentos jurisprudenciais consolidados no âmbito do STF e do
STJ, de que são exemplificativos e elucidativos os seguintes
julgados:
“Penal. Inquérito. Parlamentar.
Deputado federal. Pedido de arquivamento fundado na atipicidade do
fato. Necessidade de decisão jurisdicional a respeito:
Precedentes. Inquérito no qual se apura a eventual prática do crime
previsto no art. 349 do Código Eleitoral. Atipicidade do fato.
Arquivamento determinado.
1. Firmou-se a jurisprudência
deste Supremo Tribunal no sentido de que, quando fundado - como na
espécie vertente - na atipicidade do fato, o pedido de arquivamento
do inquérito exige "decisão jurisdicional a respeito, dada a
eficácia de coisa julgada material que, nessa hipótese, cobre a
decisão de arquivamento" (v.g., Inquéritos nº 2.004-QO,
DJ de 28/10/04, e nº 1.538-QO, DJ de 14/9/01, Rel. Min. Sepúlveda
Pertence; nº 2.591, Rel. Min. Menezes Direito, DJ de 13/6/08; nº
2.341-QO, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 17/8/07).
2. Comprovada a não ocorrência de
qualquer falsidade, não se configura o crime previsto no art. 349 do
Código Eleitoral.
3. Arquivamento do inquérito, por
atipicidade da conduta, ordenado.” (Inq 3.114/PR, Rel. Min. Dias
Toffoli, DJe de 25.08.2011)
“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS
CORPUS. PEDIDO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ARQUIVAMENTO DO FEITO.
RECONHECIMENTO DE CAUSA EXCLUDENTE DE ILICITUDE. DECISÃO PROFERIDA
POR JUÍZO ABSOLUTAMENTE INCOMPETENTE. INSTAURAÇÃO DE AÇÃO PENAL
PERANTE O JUÍZO COMPETENTE. IMPOSSIBILIDADE. COISA JULGADA.
PRECEDENTES.
1. A teor do entendimento pacífico
desta Corte, o trancamento da ação penal pela via de habeas
corpus é medida de exceção, que só é admissível quando
emerge dos autos, de forma inequívoca, a inocência do acusado, a
atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade.
Precedentes do STJ.
2. No caso, resta evidenciada essa
excepcionalidade. O arquivamento do inquérito policial no âmbito
da Justiça Militar se deu em virtude da promoção ministerial no
sentido da incidência de causa excludente de ilicitude.
3. Embora o inquérito policial
possa ser desarquivado em face de novas provas, tal providência
somente se mostra cabível quando o arquivamento tenha sido
determinado por falta de elementos suficientes à deflagração da
ação penal, o que não se verifica na espécie. Precedentes.
4. Ainda que se trate de decisão
proferida por juízo absolutamente incompetente, nos termos do
disposto no art. 9.º do Código Penal Militar, porquanto praticado
por militar fora do exercício da função, produz coisa julgada
material.
5. Recurso conhecido e provido para
determinar o trancamento da ação penal n.º 200420500013, em
trâmite na 5.ª Vara Criminal do Tribunal do Júri da Comarca de
Aracajú/SE.”
III. É direito do defensor, no
interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova
que, já documentados em procedimento investigatório realizado por
órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao
exercício do direito de defesa. CORRETO.
Trata-se da reprodução da Súmula
Vinculante nº 14, tão literal a ponto de tornar desnecessária sua
transcrição.
IV. Nos termos da orientação já
sumulada pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de execução penal a
falta de defesa técnica por defensor no processo administrativo
disciplinar não ofende a Constituição Federal. INCORRETO.
Atenção, porque se trata de
questão altamente maliciosa, na medida em que induz em erro o
candidato conhecedor da Súmula Vinculante nº 5, assim redigida: “A
falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo
disciplinar não ofende a Constituição”.
Entretanto, por mais que a aplicação
de sanção disciplinar em sede de execução penal pressuponha a
realização de prévio procedimento administrativo, não é de se
aplicar referido verbete sumular, restrito aos feitos de índole
cível, nos termos do noticiado no Informativo nº 572 do Supremo
Tribunal Federal:
“Por reputar violados os
princípios do contraditório e da ampla defesa, a Turma deu
provimento a recurso extraordinário para anular decisão do Juízo
de Execuções Penais da Comarca de Erechim - RS, que decretara a
regressão de regime de cumprimento de pena em desfavor do
recorrente, o qual não fora assistido por defensor durante
procedimento administrativo disciplinar instaurado para apurar falta
grave. Asseverou-se que, não obstante a aprovação do texto da
Súmula Vinculante 5 (“A falta de defesa técnica por advogado no
processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição.”),
tal verbete seria aplicável apenas em procedimentos de natureza
cível e não em procedimento administrativo disciplinar promovido
para averiguar o cometimento de falta grave, tendo em vista estar em
jogo a liberdade de ir e vir. Assim, neste caso, asseverou-se que o
princípio do contraditório deve ser observado amplamente, com a
presença de advogado constituído ou defensor público nomeado,
impondo ser-lhe apresentada defesa, em obediência às regras
específicas contidas na Lei de Execução Penal, no Código de
Processo Penal e na Constituição. RE 398269/RS, rel. Min. Gilmar
Mendes, 15.12.2009.”
No mesmo sentido, confira-se a
Medida Cautelar na Reclamação nº 9.143/SP (Rel. Min. Celso de
Mello, DJe 18.03.2010), noticiada no Informativo nº 579-STF,
proposta pela própria Defensoria Pública do Estado de São Paulo.
Portanto, CORRETAS as assertivas II
e III, gabarito opção “B”.
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