quinta-feira, 19 de julho de 2012

Simulado 22_2012 - Penal e Processo Penal - Questão 02


Questão 02
(FCC – DPE/SP – Defensor Público – 2012)
Princípios e garantias processuais penais fundamentais.
(A) O princípio do nemo tenetur se detegere é corolário da garantia constitucional do direito ao silêncio e impede que todo o acusado seja compelido a produzir ou contribuir com a formação de prova contrária ao seu interesse, salvo se não houver outro meio de produção de prova.
(B) Constitui nulidade relativa o desempenho de uma única defesa técnica para corréus em posições conflitantes, em razão de violação ao princípio da ampla defesa.
(C) A garantia constitucional da duração razoável do processo não se aplica ao inquérito policial por este tratar de procedimento administrativo, sendo garantia exclusiva do processo acusatório.
(D) O Superior Tribunal de Justiça vem admitindo a mitigação do princípio da identidade física do juiz nos casos de convocação, licença, promoção ou de outro motivo que impeça o juiz que tiver presidido a instrução de sentenciar o feito, aplicando, por analogia, a lei processual civil.
(E) A defesa técnica em processo penal, por ser garantia exclusiva do acusado, pode ser por ele renunciada, desde que haja expressa manifestação de vontade homologada pelo juiz competente.

Gabarito: “D”
(Comentários – Jorge Farias)

(A) O princípio do nemo tenetur se detegere é corolário da garantia constitucional do direito ao silêncio e impede que todo o acusado seja compelido a produzir ou contribuir com a formação de prova contrária ao seu interesse, salvo se não houver outro meio de produção de prova. INCORRETO.
O princípio do nemo tenetur se detegere, corolário do direito constitucional ao silêncio, não comporta a aludida ressalva, de mitigação em caso de não haver outro meio de produção de prova, pois deve ser interpretado à luz do princípio da máxima efetividade das normas constitucionais, consoante se infere de recente entendimento do STF sobre o tema:
"A Constituição Federal assegura aos presos o direito ao silêncio (inciso LXIII do art. 5º). Nessa mesma linha de orientação, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Pacto de São José da Costa Rica) institucionaliza o princípio da ‘não autoincriminação’ (nemo tenetur se detegere). Esse direito subjetivo de não se autoincriminar constitui uma das mais eminentes formas de densificação da garantia do devido processo penal e do direito à presunção de não culpabilidade (inciso LVII do art. 5º da CF). A revelar, primeiro, que o processo penal é o espaço de atuação apropriada para o órgão de acusação demonstrar por modo robusto a autoria e a materialidade do delito. Órgão que não pode se esquivar da incumbência de fazer da instrução criminal a sua estratégia oportunidade de produzir material probatório substancialmente sólido em termos de comprovação da existência de fato típico e ilícito, além da culpabilidade do acusado." (HC 101.909, Rel. Min. Ayres Britto, DJe de 19-6-2012.)

(B) Constitui nulidade relativa o desempenho de uma única defesa técnica para corréus em posições conflitantes, em razão de violação ao princípio da ampla defesa. INCORRETO.
Primeiramente, nunca se pode esquecer o princípio norteador do tema “nulidades em processo penal”, qual seja, o de que não há nulidade sem prejuízo, inscrito no art. 563 do CPP (“Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa”).
As nulidades relativas não se presumem, carecendo de demonstração do efetivo prejuízo, no caso, para a defesa. Portanto, o mero fato de corréus, ainda que em posições conflitantes, contarem com uma única defesa técnica, não induz presunção de colidência de defesas e, portanto, de eventual nulidade.
A esse respeito, confira-se elucidativo julgado do Superior Tribunal de Justiça:
CRIMINAL. HC. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. NULIDADE. (...) AUSÊNCIA DE PREJUÍZOS. CONDENAÇÃO BASEADA EM OUTROS ELEMENTOS DO CONJUNTO PROBATÓRIO. RÉU NÃO SUBMETIDO A EXAME DE SANIDADE MENTAL. CARÊNCIA
DE JUSTIFICATIVA PARA A REALIZAÇÃO DA PERÍCIA. FALTA DE PEDIDO DA DEFESA. MATÉRIA PRECLUSA. COLIDÊNCIA DE DEFESAS. NÃO OCORRÊNCIA. PATRONO DILIGENTE. TESE CONVERGENTE À ABSOLVIÇÃO DOS CO-RÉUS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA.
(...)
  1. Não se reconhece a apontada nulidade da ação penal por colidência de defesa, se evidenciada a regular assistência do patrono, durante todo o feito, o qual bem sustentou a inocência dos co-réus, ressaltando o fato de ter sido constituído pelo paciente ao mesmo tempo em que patrocinava a defesa da co-ré.
  2. VIII. Impetração que não logrou demonstrar em que ponto consistiria, efetivamente, a aduzida colidência de defesas, tendo em vista as teses convergirem para o mesmo ponto, qual seja, a tentativa de absolvição dos co-réus, por insuficiência de provas.
IX. Só se declara nulidade, no processo penal, quando sobressai efetivo prejuízo à parte, o que não restou evidenciado no presente caso. Incidência da Súmula n.º 523 do STF. Precedentes.”
(HC 64.430/DF, Rel. Min. Gilson Dipp, DJe de 18.06.2007)

(C) A garantia constitucional da duração razoável do processo não se aplica ao inquérito policial por este tratar de procedimento administrativo, sendo garantia exclusiva do processo acusatório. INCORRETO.
A CF, em seu art. 5º, inciso LXXVIII, assegura que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
Portanto, indiferente se tratar o inquérito policial de mero procedimento administrativo, pois também se submete ao aludido comando constitucional.

(D) O Superior Tribunal de Justiça vem admitindo a mitigação do princípio da identidade física do juiz nos casos de convocação, licença, promoção ou de outro motivo que impeça o juiz que tiver presidido a instrução de sentenciar o feito, aplicando, por analogia, a lei processual civil. CORRETO.
Com as reformas empreendidas no CPP por meio da Lei nº 11.719/2008, o princípio da identidade física do juiz restou positivado no art. 399, § 2º, assim redigido:
Art. 399. Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente.
§ 1o O acusado preso será requisitado para comparecer ao interrogatório, devendo o poder público providenciar sua apresentação.
§ 2o O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença.
Por se tratar de instituto trasladado do processo civil para o processo penal, entende a jurisprudência ser aplicável, analogicamente, a legislação processual civil ao caso. A esse respeito, convém trazer à colação recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, assim ementado:
HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. ALEGAÇÃO DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PLEITO PELO RECONHECIMENTO DE NULIDADE. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 132 DO CPC. INOCORRÊNCIA. INTERROGATÓRIO. INVERSÃO NA ORDEM DE FORMULAÇÃO DAS PERGUNTAS. EXEGESE DO ART. 212 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.690/08. OFENSA AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CONSTRANGIMENTO EVIDENCIADO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.
1. O princípio da identidade física do juiz, introduzido no sistema processual penal pátrio pela Lei n.° 11.719/08, deve ser analisado, conforme a recente jurisprudência da Quinta Turma deste Superior Tribunal, à luz das regras específicas do art. 132, do Código de Processo Civil.
2. O fato de o juiz substituto ter sido designado para atuar na Vara do Tribunal do Júri, em razão de férias da Juíza titular, realizando o interrogatório do réu e proferindo a decisão de pronúncia, não apresenta qualquer vício apto a ensejar a nulidade do feito. (…)” (HC 151.054/AP, Rel. Min. Adilson Vieira Macabu – Des. Conv. TJ/RJ, DJe de 03.02.2012)
Para saber mais sobre o aludido princípio, consulte nossos comentários à Questão nº 05 do Simulado nº 04/2012 de Processo Penal.


(E) A defesa técnica em processo penal, por ser garantia exclusiva do acusado, pode ser por ele renunciada, desde que haja expressa manifestação de vontade homologada pelo juiz competente. INCORRETO.
Entende-se aplicável ao caso, por analogia, o entendimento consolidado na Súmula 705-STF (“A RENÚNCIA DO RÉU AO DIREITO DE APELAÇÃO, MANIFESTADA SEM A ASSISTÊNCIA DO DEFENSOR, NÃO IMPEDE O CONHECIMENTO DA APELAÇÃO POR ESTE INTERPOSTA”).
A esse respeito, confira-se julgado elucidativo, emanado pelo Superior Tribunal de Justiça:
HABEAS CORPUS. CONDENAÇÃO. RENÚNCIA DO RÉU AO DIREITO DE RECORRER. DIVERGÊNCIA DO DEFENSOR. APELAÇÃO INTERPOSTA. PREVALÊNCIA DA DEFESA TÉCNICA. DIREITO CONSTITUCIONAL À AMPLA DEFESA. SÚMULA 705 DO STF.
1. Havendo divergência entre o réu e o seu defensor quanto à eventual interposição de recurso, deve prevalecer o entendimento da defesa técnica, porquanto, sendo profissional especializado, o defensor tem condições de melhor analisar a situação processual do acusado e, portanto, garantir-lhe o pleno exercício do direito de defesa. Inteligência do enunciado n.º 705 da Súmula do Supremo Tribunal Federal. Precedentes do STJ.
2. Ordem concedida para determinar que o eg. Tribunal a quo aprecie a apelação interposta, julgando-a como entender de direito.”
(HC 96.001/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 24.03.2008)

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